O projeto “FESTIVAL DE MÚSICA NATIVA DA FENAOESTE DE SÃO BORJA 1ª EDICÃO 2015” não é recomendado para a avaliação coletiva.
1. O projeto “FESTIVAL DE MÚSICA NATIVA DA FENAOESTE DE SÃO BORJA 1ª EDICÃO 2015”, evento vinculado a data fixa, com período de realização previsto para 15/10/2015 a 17/10/2015, em meio a programação da FENAOESTE, evento realizado desde 1964 e considerada a maior feira agropecuária da fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, no Parque Serafim Dornelles Vargas, no município de São Borja. Trata-se de evento musical, área música, cujo produtor cultural é a OLGA RITA FELICIANI FERREIRA-ME, de Jaguari, tendo na equipe principal a Produtora, José Antonio Gonçalves Moraes, como coodenador geral artístico, Carlos Omar Villela Gomes como assessor jurídico, Rita de Cássia Bittencourt como contadora e o Sindicato Rural de São Borja como apoio institucional e físico. O evento visa unir duas potencialidades da região da Fronteira Oeste através de um evento musical. A Fenaoeste recebeu 90.000 pessoas em sua última edição e o projeto dispensa orçamento para estrutura básica, pois poderá usar toda a estrutura previamente montada para a feira, o que resultará em um festival de altíssimo nível de modo a fomentar as potencialidades de ambos os eventos marcando época e deixando a marca musical atrelada a já publica e notória da FENAOESTE de São Borja. O evento já nasce com público certo, incluídos visitantes de outros Estados. O projeto é de extrema importância para o desenvolvimento cultural da sociedade como um todo, posto que São Borja é um município declaradamente ativo em prol da cultura, sede há mais de 40 anos do Festival da Barranca e que certamente ajudará em plena divulgação e valorização do evento. O objetivo geral é aproveitar o respaldo da FENAOESTE para criar um novo evento com entrada franca, podendo ser assistido pelos presentes na Feira, a fim de escoar a produção musical do RS. Dentre os objetivos específicos está fortificar o elo de parceria com a FENAOESTE e Sindicato Rural para continuar realizando o evento, promover a integração de públicos distintos e aproveitar a oportunidade de poder oferecer aos músicos classificados um palco de extrema qualidade profissional como o dos shows “nativistas” trazidos para a FENAOESTE. Serão classificadas 24 músicas para a semifinal e 10 para a final, com premiação para as 3 melhores canções, música mais popular, melhor letra, melhor melodia melhor arranjo instrumental e vocal, melhor instrumentista, melhor intérprete, melhor indumentária, prevê a realização de 4 shows com artistas consagrados: Nilton Ferreira, Jean Kirchoff, Luiz Marenco e Jairo Lambari Fernandes, por fim a produção de mil cópias de um CD com áudio do Festival. Há previsão na planilha de custos para mídia gráfica, confecção de cartazes, banners e livretos. O valor proposto do projeto e habilitado sem alterações pelo SAT é de R$ 309.978,57, tendo como fonte de financiamento unicamente o Sistema LIC.
É o relatório.
2. Projetos formatados nos moldes do presente aportam habitualmente para análise deste Conselho.
Conforme pormenorizadamente relatado, se trata de um Festival de Música Nativista com regulamento, inscrições, triagem, seleção de canções para etapa semi final e final, premiações, além de shows de abertura e encerramento.
Recentemente exarei parecer apontando o mérito cultural dos Festivais Nativistas, razões que transcrevo em parte, evitando tautologia, por se tratar de evento análogo:
A história dos festivais de música no Rio Grande do Sul inicia em dezembro de 1971, quando aconteceu a primeira edição da Califórnia da ‘Canção Nativa, em Uruguaiana. Este Pioneiro e inovador festival estimulou artistas e produtores e desencadeou a realização de muitos outros eventos semelhantes, pode-se citar como exemplo a Ciranda de Taquara e a Vindima de Flores da Cunha, logo no ano seguinte, estes festivais valorizaram além da música gaúcha, a influência da imigração alemã e italiana.
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Essa tendência, denominada nativista, desencadeou mudanças profundas nos costumes, revitalizou hábitos e passou a contar com a participação maciça da juventude, que, por sua vez, impulsionou a música feita no Rio Grande do Sul. O movimento dos festivais nativistas não apenas revitalizou, mas multiplicou o repertório do regionalismo com uma série de canções que hoje já são consideradas clássicos do cancioneiro gaúcho. Este movimento nativista provocou a criação de programas de rádio e televisão com enfoque regionalista e o surgimento de jornais e revistas especializados nesse setor. O mercado de trabalho se expandiu de maneira nunca vista na história da música regional, seja em número de gravações de discos, seja em espaço de shows que revelaram e consolidaram o prestígio de músicos, compositores e intérpretes. Além do desenvolvimento da economia da cultura, que proporcionou a sustentabilidade financeira a vários segmentos da sociedade, os festivais mobilizaram comunidades no interior do Estado. As disputas musicais tornaram-se eventos importantes para muitos municípios, que passaram a aguardar a realização de seus festivais para ouvir as músicas concorrentes e assistir os shows apresentados. O interesse do público também estimulou a criação de novas mostras competitivas. O Rio Grande do Sul tem uma trajetória de quarenta anos de festivais, os quais certamente representam um ciclo na história musical do Estado. Hoje, o Estado conta com cerca de 30 festivais de música ativos.”
O que se vê é que ano a ano surgem novos festivais, outros, antigos desaparecem e alguns que estavam parados voltam a se realizar. Esta dinâmica está intrinsecamente ligada às políticas de incentivo a cultura e ao apoio das prefeituras municipais. Mas não resta dúvida de que é um mercado que movimenta economicamente o Estado e os municípios.
O proponente ressalta a realização do Festival da Barranca em São Borja como indício do potencial de vocação cultural do seu evento, contudo, tenho que não há a pretendida semelhança, pois a Barranca é um Festival que se propõe manter-se simples, crioulo e sem estrelismo, sem parafernálias de som e luz, cantado na beira do rio, no mato e ao pé do fogo-de-chão. Eis as palavras do atual Presidente do IGTF, artista com vivência ímpar nos festivais nativistas (disponível em http://zh.clicrbs.com.br/rs/entretenimento/noticia/2015/04/vinicius-brum-festival-da-barranca-4742110.html):
Conforme relato de Aparício Silva Rillo, em texto escrito em 1985, o Festival da Barranca, contrariando os racionalistas, nasceu por acaso. Contudo, se o nascimento foi regido pela casualidade, podemos afirmar que a sua longevidade e a sua permanência podem ser compreendidas pelo esforço de alguns e pela necessidade de muitos. A Barranca é um fenômeno voluntário, intencional, que trabalha para que não haja dispersão. Lá se canta para reunir.
O alimento que se busca é algo que está instalado no etéreo, no imaterial, no que levou o nosso Sérgio Jacaré Metz a cunhar a epígrafe Comício de Espíritos. A urgência do nosso mundo diminui nossa disponibilidade para conviver. Hoje as relações estão virtualizadas. Reconheço o outro, mas ele não está. E, mesmo que os diálogos se efetivem, essa não presença de alguma forma explicita também um não diálogo.
Ausentes as sensações do gesto, do olhar e da respiração, as conversas e os encontros realizam-se dentro de uma redoma em que não estamos completos porque não completamos e nem podemos ser completados. E é por isso que, a cada Semana Santa, lá nos encontramos. Por redundante que possa parecer, encontramo-nos simplesmente para celebrar o encontro. Esse é o nosso alimento. Não importa o frio, a chuva, o barro, o calor ou a poeira. Importa é que estamos e, como faziam os primeiros habitantes daquelas plagas missioneiras, na roda grande ao redor do fogo deslateralizamos as relações.
Passamos a vida mergulhados em águas profundas, e vamos anualmente para aquela barranca de rio, em São Borja, para recarregar nossos tubos de oxigênio. A autonomia dessas cargas dura apenas até a próxima Semana Santa, portanto, esta é a nossa condição: se não vamos, morremos um pouco, morremos um tanto por absoluta falta de ar, de sonho, de música e de uma irremediável saudade do mato, do rio, dos amigos e da nossa, talvez, única e melhor possibilidade. Seguimos nessa cíclica jornada lembrando os que já se foram, celebrando com quem está e esperando quem vai chegar: pra ser eterna a Barranca, só pode ser breve a vida!
Assim, concluo que é meritória a manutenção de um formato originalmente criado, sendo, no caso específico da Barranca, dispensáveis quaisquer inovações.
Contudo, o mesmo não se diga da grande maioria dos Festivais Nativistas do nosso Estado, onde a inovação seria não só desejável como necessária, inclusive para manter seu encantamento com a comunidade local e provocar a participação ativa do poder público municipal, que se afastou da realização da grande maioria deles.
Com todo o dito, se reafirma a importância dos Festivais de Música Nativista para a Cultura do Estado do RS, mas, diante da especificidade de cada um, é preciso que sejam individual e criteriosamente apreciados, quanto a sua conveniência e oportunidade frente ao pedido de investimento de verbas públicas.
Mais uma vez ressalto que não se está discutindo a competência administrativa e artística dos nomes que compõe a planilha de custos, ao contrário, se tratam de pessoas de inquestionável idoneidade e capacidade, com longa trajetória profissional dedicada a cultura do nosso Estado.
Aqui me atenho ao fato de que o evento se realiza dentro de uma Feira Agropecuária que tem vasta programação de shows nacionais, dentre eles estão previstos grandes nomes da música sertaneja, tais como Luan Santana (disponível em http://www.radiosaoluiz.com/noticias/ver/cat/8/id/13048/fenaoeste-2015-e-lancada-oficialmente.html), cujos altos custos são de conhecimento público. Reconheço sim a necessidade e importância da presença de artistas gaúchos, através da música nativista no evento, contudo, fica a questão: porque o pontapé inicial tem que ser com recursos públicos do Estado do RS? Como afirma o proponente, a FENAOESTE iniciou em 1964, e é a maior feira agropecuária da fronteira Oeste.
Em que pese o louvável empréstimo das instalações do palco para as apresentações do Festival, não reconheço a efetiva parceria com o Sindicato Rural. O Festival assim como apresentado traria mais benesses ao evento maior, FENAOESTE, do que ao incremento da cultura musical no RS, sendo apenas mais um atrativo da própria Feira.
Gize-se que se tratando de uma feira de agropecuária, diga-se a maior da fronteira oeste do RS, está intimamente ligada ao homem do campo, causa espécie não tenha o dito parceiro Sindicato Rural, em respeito e homenagem ao cancioneiro nativo, ao menos suportado parte dos custos ora requeridos. Pois o mega palco está preparado para as estrelas nacionais que virão, e, quando vago, seria cedido para o Festival, portanto é falacioso o aporte de R$ 89.808,57 constantes no item 1.36 da planilha de custos, pois não há doação alguma ao evento.
Reitero que reconheço o mérito cultural do projeto como Festival de Música Nativista, mas no contexto em que proposto, resta afastada a conveniência e oportunidade indispensáveis ao enquadramento legal da Lei de Incentivo à Cultura/RS.
3. Em conclusão, o projeto “Festival de Música Nativa da Fenaoeste de São Borja 1ª Edicão 2015” não é recomendado para a Avaliação Coletiva.
Porto Alegre, 24 de novembro de 2015.
Alessandra Carvalho da Motta
Conselheira Relatora
Informe:
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
Sessão das 14 horas do dia 24 de novembro de 2015.
Presentes: 19 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Jaime Antônio Cimenti, Aldo Gonçalves Cardoso Junior, Ruben Francisco Oliveira, Adriana Donato dos Reis, Élvio Pereira Vargas, Antônio Carlos Côrtes, Fabricio de Albuquerque Sortica, Marco Aurélio Alves, Lisete Bertotto Corrêa, Maria Silveira Marques, Rafael Pavan dos Passos, Luiz Carlos Sadowski da Silva, Neidmar Roger Charão Alves, Jacqueline Custódio, Vinicius Vieira, Susana Fröhlich e Walter Galvani.
Dael Luis Prestes Rodrigues
Conselheiro Presidente do CEC/RS
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