O projeto "RINCÃO DA DANÇA GAÚCHA, 1ª EDIÇÃO", em grau de recurso, não é acolhido.
1. RELATO RESUMIDO DO PROJETO - O projeto RINCÃO DA DANÇA GAÚCHA, 1ª EDIÇÃO, está inscrito na área de Artes Cênicas – Dança e não está vinculado à data fixa. Trata-se de um evento competitivo de danças tradicionais gaúchas e pretende ser realizado no município de Teutônia, junto ao CTG Rincão das Coxilhas, cuja carta de anuência está presente nos anexos do projeto.
O projeto ressalta as seguintes empresas e pessoas como equipe principal: Açoriana – Associação de Cultura, Eventos e Promoções, na função de produção cultural; José Oliveira Estivalet, na função de produção executiva e apresentador; MJ Produtora de Eventos, na função de Coordenação Geral.
Segundo o corpo do projeto e seus anexos, as categorias a participarem do evento são as seguintes: infantil — por vezes também referida como pré-mirim — (até 9 anos), mirim (até 13 anos), juvenil (até 17 anos), adulta (mínimo de 15 anos) e xirú (mínimo de 30 anos) para danças tradicionais gaúchas para invernadas e, nas mesmas categorias, exceto a infantil ou pré-mirim, para danças tradicionalistas de salão. O regulamento artístico a ser aplicado no evento será o utilizado pelo MTG. Estão previstas premiações em dinheiro para os 4 primeiros lugares de cada categoria, além de troféus para os 5 primeiros lugares. Poderão participar da competição representantes de entidades tradicionalistas de todo o estado do Rio Grande do Sul, desde que devidamente filiadas ao Movimento Tradicionalista Gaúcho. O evento ainda conta com 2 shows musicais, a saber: César Oliveira & Rogério Melo e Grupo Luz de Candeeiro.
Como objetivo geral do projeto está a realização da competição artística acima descrita. Como objetivos específicos, estão listados:
- agregar em um só evento as danças tradicionais gaúchas para invernadas e duplas (danças de salão), através de competidores de todo o estado do Rio Grande do Sul;
- promover o intercâmbio cultural entre TODOS os presentes no evento;
- incentivar a competição saudável;
- proporcionar uma programação cultural de qualidade, com classificação livre e entrada franca;
-realizar apresentações musicais de dois artistas ícones da música nativista gaúcha;
- afirmar ao público valores da história e tradição gaúcha.
“O evento propriamente dito acontecerá em três dias: no primeiro dia acontecerá a solenidade oficial e show de abertura do evento. No segundo dia do festival as atividades iniciarão com a competição e apresentação dos inscritos nos concursos. Após todas as apresentações do dia, uma apresentação musical encerrará o primeiro dia de competição do festival. No terceiro dia inicia-se o festival com apresentações das modalidades restantes em ambas as competições. Durante a somatória de planilhas e a apuração dos vencedores, é previsto que aconteça, como em diversos festivais de dança, um momento de integração para os grupos competidores, quando estes dançam entre si, trocando os pares”
O evento, que pretende alcançar um público de 3.000 pessoas, solicita o valor de R$ 355.227,00, integralmente habilitados pelo SAT, sendo o sistema LIC/RS a única fonte financiadora buscada pelo proponente.
RESUMO DO RELATO DO PRIMEIRO PARECER (ANTES DO ENVIO DO RECURSO) - O projeto em tela foi relatado ao pleno deste Conselho em 10 de agosto de 2016, sendo que a conselheira relatora não o recomendou para avaliação coletiva. O pleno, por sua vez, referendou o parecer apresentado por unanimidade. Em sua avaliação, a conselheira relatora expressa sua inconformidade quanto à área em que o projeto foi inscrito, sendo de sua percepção que “projetos desta natureza devem ser qualificados na área de tradição e folclore diante da justificativa apresentada.” Tal afirmação é firmemente substanciada pela íntima ligação do evento com o Movimento Tradicionalista Gaúcho. A seguir, o parecer transcreve alguns trechos do regulamento do ENART, evento competitivo realizado sob a coordenação do Movimento Tradicionalista Gaúcho em parceria, atualmente, com o Estado do RS, através da LIC, e com a prefeitura de Santa Cruz do Sul. Tais trechos explicitam que somente poderão concorrer no referido evento participantes com, pelo menos, 15 anos de idade e que, sob qualquer circunstância, poderá ser oferecida premiação em dinheiro. A seguir, a relatora contrasta essas informações com o regulamento proposto para o evento competitivo do projeto em análise, uma vez que este não somente permite a participação de menores de 15 anos (na verdade, o projeto não estabelece uma idade mínima para que se possa participar do mesmo) como também oferece premiação em dinheiro. Na sequência do parecer, a relatora tece uma série de reflexões sobre o oferecimento de prêmio em dinheiro para crianças e adolescentes e sobre o real mérito cultural de projetos de caráter essencialmente competitivo. A relatora se debruça em diversas reflexões e ponderações, citando literatura técnica acerca do envolvimento de crianças em instâncias competitivas de diversas naturezas. O parecer ainda faz alusão ao fato de que a premiação diverge em valores, dependendo da categoria em que o participante estiver inscrito, sendo que tal diferenciação não se aplica aos jurados quando em avaliação de diferentes categorias. A argumentação segue chamando a atenção para o fato de que, uma vez que são os pais que devem receber a premiação para os menores de 14 anos no projeto em análise, poder-se-ia inclusive aludir à prática do trabalho infantil. Tendo até este ponto do parecer se detido aos aspectos referentes à avaliação da relevância do projeto, a relatora passa a analisar questões concernentes ao aspecto de sua oportunidade. Neste sentido, considera a Conselheira o projeto “extremamente e injustificadamente oneroso para os fins buscados”, sendo tal afirmação, em seguida, substanciada por ponderação acerca de itens presentes na planilha orçamentária. A finalização do parecer se dá, como já mencionado, pela não recomendação do projeto à avaliação coletiva.
RELATO RESUMIDO DO RECURSO – O proponente, após afirmar seu respeito à posição da relatora quanto à participação de crianças em eventos competitivos, argumenta acreditar que “esse suposto comportamento hostil não tem reflexo no cenário do qual fazem parte os certames que valorizam a cultura e a tradição do Rio Grande do Sul.” O proponente acrescenta sua percepção:
“eventuais posturas violentas de uma ou outra criança, resultam, principalmente, do ambiente no qual elas vivem e/ou são criadas. Não é demasiado imaginar que os principais aspectos que proporcionam fortuitos deslizes negativos de conduta por parte dos filhos, são a frequente ausência (física e intelectual) dos pais, consorciada à falta de educação e de disciplina das crianças. Bem ao contrário do que ocorre nos rodeios e concursos tradicionalistas (...)”
Quanto à premiação em dinheiro, o proponente ressalta que “na prevalência absoluta das vezes, [esta é] direcionada ao custeio de despesas de locomoção e até mesmo na aquisição de artigos inerentes à indumentária do próprio concorrente ocasionalmente premiado”. O proponente enfatiza que os pais não lucram com os valores que são pagos em caso de premiação, uma vez que são, na verdade, os grandes patrocinadores dessas “atividades, prazerosas e formadoras de conceitos importantes para estas crianças.” O recurso chama a atenção ainda para o fato de que rodeios, festivais e concursos artísticos ocorrem “quase que semanalmente no Rio Grande do Sul”, argumentando o seguinte:
“o que se percebe são participantes e competidores seguindo normas regimentais, conhecidas por todos que frequentam estes encontros. Tais regras incentivam os concorrentes a valorizarem o sentido de conjunto, a solidariedade e a igualdade de condições entre todos, penalizando, inclusive, os que tem comportamentos divergentes. Evidentemente que nas modalidades individuais existem aqueles que se destacam por serem mais talentosos ou mais preparados, mas não a ponto de tornarem-se arrogantes ou demonstrarem menosprezo em relação a seus companheiros de disputa.”
O recurso salienta ainda que o projeto em tela de forma alguma se contrapõe ao que é estabelecido pelo MTG, tanto no que diz respeito às modalidades e categorias, quanto em sua premiação. Cita textualmente, inclusive, o “Art. 60 - A premiação ficará a critério dos organizadores, sendo vedada a premiação que envolva bebidas alcoólicas.” Por fim, o recurso ainda responde à observação do parecer que considera o projeto oneroso. O proponente, a fim de não ter seu projeto inviabilizado, sugere que o “Conselho proceda as glosas que julgar necessárias, se estas medidas deixarem-no [o projeto] exequível e em condições de restabelecer seu prosseguimento normal.” O recurso ainda salienta o fato de que o projeto já se encontra no Sistema LIC/RS há quase um ano, e que no município de Teutônia já foi criada “uma imensa e positiva expectativa em torno da execução do Festival, por se tratar de um evento mobilizador daquela coletividade, que proporcionará entretenimento e gerará emprego e renda para muitas pessoas.”
É o relatório.
2. PARECER QUE ANALISA O PROJETO EM GRAU DE RECURSO – Analisando o recurso, percebe-se que o questionamento feito pela relatora quanto à área de inserção do projeto no Sistema LIC/RS não é contestado pelo proponente, do que posso concluir que o mesmo consente que a proposta deveria estar mesmo inserida na área de Tradição e Folclore e não em Artes Cênicas, tal como foi submetida. Sublinho esta constatação, uma vez que a ótica sob a qual analisaria este projeto seria bastante distinta, tendo em vista a natureza e realidade das Artes Cênicas, neste caso, especificamente, a Dança. Quer dizer, aponto para o fato de que há diversos aspectos e detalhes que seriam inevitáveis discutir, analisar, questionar e aprofundar, mas que acabam perdendo a relevância quando, ao mudar de área, muda, necessariamente, também o foco de análise para tentar estabelecer, na melhor de minhas possibilidades, se o projeto se revela meritoso a fim de obter a recomendação para receber recursos através do Sistema LIC/RS.
O primeiro ponto questionado no recurso sobre o parecer primeiramente emitido diz respeito à participação de crianças em eventos de natureza essencialmente competitiva. Ora, a participação de crianças em competições é, no mínimo, polêmica, sendo que uma breve consulta à internet com palavras-chave já permite constatar que as opiniões, mesmo dentre os especialistas, divergem, oscilando entre extremos opostos. Assim sendo, não me parece que seja o caso tentar estabelecer uma verdade absoluta, tarefa que se revelaria totalmente infrutífera. Atenho-me primeiramente, portanto, às argumentações apresentadas pelo parecer e pelo recurso. Nesse sentido, verifica-se que enquanto a relatora procurou substanciar sua opinião com dados técnicos, conclusões de especialistas e estudos científicos, o proponente se limitou a oferecer unicamente seu ponto de vista, o qual sequer é apresentado com um grau de reflexão mais aprofundado, permanecendo na observação superficial do que diz perceber sobre outros eventos competitivos semelhantes e sobre seu conhecimento empírico do ambiente que o projeto pretende abranger. A meu ver, perdeu o proponente a oportunidade de contestar a argumentação em termos de maior igualdade, especialmente porque, como já frisei, encontraria amplo suporte na literatura técnica. Esclareço ao proponente que, pessoalmente, não compartilho de forma integral da visão apresentada no parecer no que diz respeito à participação de crianças em eventos competitivos. Partilho da opinião de que a competição não é resultante de um construto social ou cultural e, sim, inerente à condição humana e, na minha percepção, ao grau ainda muito incipiente de evolução de nossa espécie, que se mostra incapaz de se perceber e reconhecer seu próprio valor sem estabelecer comparações e ranqueamentos de suposta superioridade de uns sobre outros. Infelizmente, a julgar pela morosidade com que a humanidade está progredindo naquilo que mais importa — seus valores — parece que a competição ainda estará se fazendo muito presente entre nós por um longo tempo, de forma que, a meu ver, não é o caso de se tentar inutilmente bani-la ou minimizá-la, mas redirecioná-la e substanciá-la com determinados valores voltados para a construção de uma sociedade mais digna e inclusiva. Mas, voltando à questão da participação das crianças na proposta do evento em questão: por mais que não seja totalmente avessa à participação de crianças em eventos competitivos, como frisei, preciso observar, entretanto, que a inexistência de uma idade mínima de participação no evento (lembro aqui que a categoria infantil, ou pré-mirim, só delimita a idade máxima, que é de 9 anos) é, na melhor das hipóteses, problemática. O proponente haverá de concordar que o regulamento abre espaço para que participem da competição crianças que, como se diz no popular, mal saíram das fraldas. Nestes casos, é impossível conceber que essas crianças possam ter condições de entender minimamente o que uma competição como esta envolve. Vejo razões para questionar se estão competindo por vontade própria ou se, na verdade, são motivadas especialmente pela vontade dos pais, os quais, por uma miríade de motivos ou razões, procuram satisfazer seus próprios desejos e expectativas através dos filhos, sem se darem conta, provavelmente, das possíveis consequências na vida das crianças. Além disso, como docente em dança, posso afirmar que, no que se refere a apresentações cênicas, antes de competir pela primeira vez, as crianças precisam de muitas oportunidades se apresentando para diversos públicos, a fim de ganharem experiência e desenvolverem habilidades no que se refere à inteligência emocional, qualidades artísticas — tanto de expressividade, quanto de percepção musical — e capacidades referentes ao seu desenvolvimento motor, entre tantas outras. O importante nos primeiros anos de contato com a Dança é que as crianças pequenas aproveitem o momento da apresentação, que por si já exige bastante, sem terem de se preocupar com um julgamento acerca de sua performance. Portanto, neste ponto, não vejo como posso acolher o argumento do proponente.
O segundo ponto apresentado no recurso discute a premiação em dinheiro para crianças. O proponente, através de citação direta, comprova que, de fato, não viola o que o MTG estabelece, uma vez que a proibição deste se refere a bebidas alcoólicas. A própria conselheira relatora não estabelece a proibição do MTG frente a prêmios em dinheiro, sendo que, em seu parecer, alude somente ao regulamento do ENART, este, sim, proibitivo frente à oferta de dinheiro nas premiações. A questão é, uma vez que o ENART é coordenado pelo MTG, entendo, muito embora não seja especialista no assunto, que se o MTG não proíbe premiações em dinheiro em competições de dança, pelo menos, não o recomenda. Caso contrário, como explicar que em seu próprio evento vede este tipo de premiação? Esclareço ao proponente que estou me referindo tão diretamente ao MTG porque o próprio proponente faz questão de ressaltar, por diversas vezes em seu projeto, a observância ao que preconiza o Movimento Tradicionalista Gaúcho. Saliento também que não questiono as razões pelas quais opta o proponente por fazer isso, só observo que o faz. No entanto, quanto ao oferecimento de prêmios em dinheiro para crianças, informo ao proponente que este Conselho de Cultura tem sido unânime no que diz respeito a não recomendar a utilização de recursos públicos para este fim. Os motivos que nos levam a tomar esta posição é a percepção de que crianças não possuem condições de dimensionar a valoração do dinheiro e, uma vez que serão os pais a receberem a premiação, também não se pode prever o fim que a quantia recebida terá. Concordo com o proponente plenamente quando diz que os pais são, via de regra, os grandes patrocinadores dos filhos, já que o que gastam com indumentária, entre tantos outros custos diretos e indiretos, acaba sendo superior ao valor da premiação. No entanto, a questão aqui é de outra ordem e se refere ao lado educativo-pedagógico envolvido. Lembremos que os períodos da infância e adolescência, de forma alguma, devem ser tomados única e exclusivamente como fases preparatórias para a idade adulta, ainda que também o sejam. A literatura técnica na área é farta neste sentido, de forma que sequer preciso mencionar referências. Sabendo que as crianças se encontram em uma fase muito incipiente da racionalização de seus conceitos sobre o mundo, sendo, obviamente, muito mais complexo o processo de elaboração de valores mais abstratos, como acontece com o dinheiro, pode ser bastante complicada esta espécie de premiação para elas no que pese, como já dito, o lado educativo-pedagógico, de forma que parece ser muito mais prudente não conceder este tipo de premiação.
Aliás, sobre a premiação em dinheiro de forma geral, gostaria de tecer algumas considerações que creio serem fundamentais para esta explanação. No meu entender, no tocante à área artística, a única razão para o oferecimento de premiações envolvendo pecúnia seria com o objetivo de incentivar talentos no caminho da profissionalização, uma vez que a diferença fundamental entre amador e profissional é o pagamento da atividade exercida. O próprio Sistema Nacional de Cultura e o Plano Nacional de Cultura, ao estabelecerem o tripé que alicerça as políticas públicas culturais, a saber: dimensões simbólica, cidadã e econômica, abrem caminho, entre tantas outras linhas de ação, para o fomento da profissionalização do artista. Como se vê, neste sentido, o papel do Estado é de extrema importância, especialmente dada a fragilidade do cenário a que o mercado artístico é submetido em nosso país, sendo flagrante a falta de condições de trabalho para numerosos artistas, que estão muito aquém na obtenção de direitos já há muito conquistados pela grande maioria das demais categorias. Assim, entendo que o uso de recursos públicos para pagamento de premiações artísticas se justifica somente, salvo melhor juízo, quando há uma clara proposição do projeto nesta direção. Entretanto, ao analisar os objetivos do projeto, já transcritos nesta análise, percebo que não é mencionado, ainda que tangencialmente, o fomento profissional dos dançarinos participantes, tratando-se de um evento competitivo voltado a amadores. Gostaria de frisar que não há aqui nenhuma espécie de diminuição do mérito cultural de eventos amadores em comparação a profissionais, nem mesmo o entendimento de que a qualidade técnica e artística de dançarinos amadores é, necessariamente, inferior. Eu mesma já presenciei por inúmeras vezes, amadores com performance muito superior a profissionais. Contudo, lembro que talento está longe de ser sinônimo de profissionalismo, muito embora seja um dos componentes desejáveis para o sucesso em qualquer área. Como a própria palavra denota, a distinção fundamental está em que o amador pratica determinada atividade, neste caso de natureza artística, por uma questão de apreciação pessoal e prazer, enquanto o profissional dedica seus esforços também no sentido de construir um meio de vida, priorizando a atividade artística em detrimento de outras, com vistas a obter o seu sustento e de seus dependentes através de sua arte, atentando para aspectos muito mais amplos em sua formação, investindo tempo e fazendo sacrifícios como qualquer outro profissional o faz. Finalizando este ponto do parecer, uma vez que o evento em questão é claramente de natureza amadora com base em seus objetivos, à luz das considerações aqui tecidas, não vejo como recomendar o uso de dinheiro público para o pagamento de nenhuma premiação neste projeto, independente da idade dos participantes.
O próximo ponto do recurso se refere aos custos do projeto, considerados, pela relatora, onerosos e incompatíveis com os fins aos quais se propõe. Após estudo do projeto, manifesto que compartilho integralmente da opinião da relatora neste ponto. Em seu recurso, o proponente, por sua vez, deixa claro que fica a critério deste Conselho glosar o projeto de forma a não inviabilizar sua execução. Esclareço ao proponente, no entanto, que a adequação da planilha orçamentária somente influenciaria a questão do mérito cultural no que diz respeito à oportunidade do projeto e não quanto à sua relevância. De forma que, um ajuste nos valores orçamentários não corrigiria questões de mérito que se provaram inconsistentes com os parâmetros seguidos por este Conselho para recomendação de uma proposta cultural. .
Por fim, o proponente ainda utiliza como argumentação o longo período pelo qual o projeto já tramita no Sistema LIC/RS e a imensa expectativa que se gerou na cidade em função da possível realização do festival. Pessoalmente, não me causa nenhum prazer em negar um projeto. Tenho perfeita ciência do laborioso processo envolvido na formatação de uma proposta, do tempo e dos esforços despendidos, que acabam, para insatisfação do proponente, revelando-se infrutíferos neste caso. Esclareço ao proponente, no entanto, que se tal expectativa foi estimulada em relação à realização do projeto na comunidade envolvida, isso ocorreu por conta e risco do proponente. Lembro ao mesmo que, por mais convicto que esteja em relação à sua proposta, o caminho que um projeto trilha desde sua elaboração até a obtenção do financiamento é composto por diversas instâncias nas quais o proponente não tem qualquer ingerência. Ainda que o projeto tivesse obtido parecer favorável para sua recomendação por parte da conselheira relatora, teria de obter aprovação do Pleno deste Conselho. Além disso, precisaria disputar recurso com outros projetos nas avaliações coletivas, nas quais não é raro que o montante de recursos solicitados para uma mesma avaliação ultrapasse o dobro do teto que este Conselho dispõe para distribuir, ficando projetos meritosos e recomendados sem a possibilidade de buscar a obtenção de recursos junto a possíveis patrocinadores. Há ainda os projetos que, infelizmente, acabam não se realizando por impossibilidade de captação. Em suma, não pode pretender o proponente colocar sob-responsabilidade deste Conselho a frustração de toda uma comunidade pela não realização do projeto.
3. Em conclusão, o projeto "RINCÃO DA DANÇA GAÚCHA, 1ª EDIÇÃO", em grau de recurso, não é acolhido.
Porto Alegre, 30 de setembro de 2016.
Marlise Nedel Machado
Conselheira Relatora
Informe:
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
Recurso não acolhido pelo Pleno
Sessão das 13h30min do dia 03 de outubro de 2016.
Presentes: 23 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Jaime Antônio Cimenti, Ivo Benfatto, Paula Simon Ribeiro, José Mariano Bersch, Luiz Armando Capra Filho, Élvio Pereira Vargas, Erika Hanssen Madaleno, Alessandra Carvalho da Motta, Marco Aurélio Alves, Dael Luis Prestes Rodrigues, Gilberto Herschdorfer, Maria Silveira Marques, Ieda Gutfreind, Luiz Carlos Sadowski da Silva, Luciano Fernandes, Vinicius Vieira, Lucas Frota Strey e Walter Galvani.
Abstenções: Rafael Pavan dos Passos.
Ausentes no Momento da Votação: Bibiana Mandagará Ribeiro e Ruben Francisco Oliveira.
Antônio Carlos Côrtes
Conselheiro Presidente do CEC/RS
O projeto “RINCÃO DA DANÇA GAÚCHA 1ª EDIÇÃO” não é recomendado para a avaliação coletiva.
1. O projeto “RINCÃO DA DANÇA GAÚCHA 1ª EDIÇÃO”, evento não vinculado a data fixa, é um evento competitivo de danças tradicionais gaúchas e danças de salão. No primeiro caso, para invernadas nas categorias infantil, mirim, juvenil, adulta e xirú, e, no segundo, para duplas. Será realizado na cidade de Teutônia/RS e pertence a área de artes cênicas: dança. Receberá competidores de todo o RS, serão premiados os 5 primeiros colocados de cada categoria (incluindo aí a modalidade de dança de salão), totalizando 36 premiações, em dinheiro e 45 troféus. Os regulamentos dos concursos serão confeccionados de acordo com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo Regulamento Artístico do MTG do RS. O evento ocorrerá no CTG Rincão das Coxilhas, espaço cedido conforme autorização em anexo ao projeto. Nas noites de realização do evento acontecerão shows com músicos consagrados do RS, César Oliveira & Rogério Melo e Grupo Luz de Candieiro. As inscrições ocorrerão com 30 dias de antecedência e serão enviadas por email, o número de inscritos será limitado conforme o regulamento. Os participantes deverão portar o seu cartão tradicionalista. Poderão participar da competição, representantes de entidades tradicionalistas de todo o Estado do Rio Grande do Sul, desde que devidamente filiadas ao Movimento Tradicionalista Gaúcho. Sustenta o proponente que com a realização deste evento a cultura tradicional gaúcha torna-se protagonista em um espaço/tempo determinados pelas atividades do projeto, assim promovendo o desenvolvimento cultural do estado. Eventos como este, que trazem em sua essência a confraternização e integração entre admiradores e praticantes da cultura tradicional gaúcha, permitem que artistas, público e seus colaboradores acessem um imenso acervo cultural e histórico, em um importante processo de valorização das suas tradições. São fundamentais para o sucesso do evento uma boa estrutura, equipamentos de som e luz com qualidade, artistas populares e, principalmente, o acesso democrático as atividades propostas, tendo todas elas de classificação livre e entrada franca. Dentre os objetivos específicos estão: agregar em um só evento as danças tradicionais gaúchas para invernadas e duplas (danças de salão), através de competidores de todo o estado do Rio Grande do sul, promover o intercâmbio cultural e incentivar a competição saudável, proporcionar uma programação cultural de qualidade, com classificação livre e entrada franca, realizar apresentações musicais de dois artistas ícones da música nativista gaúcha e afirmar ao público valores da história e tradição gaúcha. Refere o proponente que para isso, é imprescindível que se obtenha recursos e apoio, e a Lei de Incentivo à Cultura do Rio Grande do Sul é a melhor escolha: ela proporciona isenção fiscal aos patrocinadores. Com o conteúdo proposto possuindo caráter regional, as empresas regionais tornam-se o alvo das ações de captação de recursos. O evento espera 3.000 pessoas, será realizado pela Açoriana Associação de Cultura, Eventos e Promoções, na equipe principal estão José Oliveira Estivalet na função de produção executiva e apresentador, MJ Produtora de Eventos na coordenação geral e Cristiane M de Araújo como contadora. O valor proposto do projeto e habilitado sem alterações pelo SAT é de R$ 355.277,46, tendo como fonte de financiamento unicamente o Sistema LIC.
2. Primeiramente, ressalto que avaliei, recentemente, o projeto Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau 3ª Edição- 2016, apresentado pelo produtor Açoriana – Associação de Cultura, Eventos e Promoções, em formato idêntico ao projeto que ora se avalia.
Não vejo motivos para alterar a convicção firmada quando da avaliação do anterior citado projeto, que adoto novamente, evitando tautologia. Tenho que projetos desta natureza devem ser qualificados na área de tradição e folclore diante da justificativa apresentada.
Por economia, posto as razões antes por mim apresentadas, já são de conhecimento deste Conselho, transcreverei apenas parte dos fundamentos que julgo suficientes, no caso, para deixar de recomendar o projeto na forma que se encontra.
Conforme relata o proponente se trata de um evento competitivo de danças tradicionais gaúchas para invernadas nas categorias infantil, mirim, juvenil, adulta e xirú e, da mesma forma, de danças de salão tradicionalistas gaúchas, para duplas.
Há previsão de premiação para os 5 primeiros colocados em cada uma das categorias (incluindo aí a modalidade de Dança de Salão), totalizando 36 premiações em dinheiro e 45 troféus.
O regulamento para os concursos será confeccionado de acordo com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo Regulamento Artístico do MTG do Estado do Rio Grande do Sul.
Adverte o proponente que na apresentação, cada participante deverá portar o seu cartão tradicionalista e que poderão participar da competição, representantes de entidades tradicionalistas de todo o Estado do Rio Grande do Sul, desde que devidamente filiadas ao Movimento Tradicionalista Gaúcho.
Conforme se nota, há uma estreita vinculação do projeto com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo regulamento artístico do MTG.
É de conhecimento público que os Festivais competitivos se multiplicaram nos últimos anos, merecendo atenção da mídia e dos responsáveis pela produção cultural do Estado.
É reconhecido o caráter eminentemente divulgador e mantenedor da cultura regional em eventos como o que se apresenta, contudo entendemos que merecem atenção importantes pontos que tem passado despercebidos aos produtores.
Os Festivais e Rodeios Artísticos do RS, atualmente, apresentam evidente inspiração e regramento baseado no Encontro de Artes e Tradições Gaúchas, o ENART, realizado sobre a coordenação do Movimento Tradicionalista Gaúcho em parceria hoje com o Estado do RS, através da LIC e prefeitura de Santa Cruz do Sul. Considerado pela UNESCO como o maior Festival de Arte Amadora da America Latina, o evento envolve, ano após ano, milhares de pessoas, entre concorrentes, visitantes e organizadores, contando com investimento público, privado e de colaboradores não remunerados para a sua realização.
Transcrevo, no que importa para esta fundamentação, alguns artigos do citado Regulamento do ENART:
Art. 4º - Somente poderão participar do ENART aqueles concorrentes, incluindo seus músicos acompanhantes, que completarem 15 (quinze) anos de idade até o dia definido para o início da fase final.
(...)
Art. 70 - Nas duas etapas iniciais não haverá premiação.
Art. 88 - É vedado aos promotores do ENART, em qualquer uma de suas etapas, o oferecimento de prêmios em dinheiro a qualquer participante e sob qualquer circunstância.
Consta no regulamento anexado pelo proponente a seguinte classificação para o concurso de danças tradicionais, categorias: Infantil - até 09 (nove) anos; Mirim - até 13 (treze) anos; Juvenil - até 17 (dezessete) anos; Adulta - mínimo 15 (quinze) anos; Xiru - mínimo de 30 (trinta) anos. E para o concurso de danças de salão, categorias: Mirim, Juvenil, Adulta e Xirú. O que segue os ditames do regulamento artístico do MTG/RS.
Verifico que as diretrizes e critérios que constam no regulamento do presente projeto correspondem aos ditames do MTG/RS em relação as categorias, conteúdo artístico das apresentações, coreografia, música, etc, e, não com a premiação em dinheiro, porque esta é vedada expressamente.
Sabe-se que a premiação em dinheiro traz em seu bojo um atrativo aos concorrentes, contudo, há que se fazer uma séria reflexão ao oferecimento de prêmio em dinheiro para crianças e adolescentes.
Consta do regulamento do presente projeto quanto à premiação que: XIII - Para o recebimento dos valores das premiações é necessário que o competidor apresente troféu, cartão tradicionalista, documento de identidade. Para os menores de idade, deverá ser indicada outra pessoa maior de idade e portando documento de RG e do premiado também. XIV - A produtora cultural/organização do festival não pagará as despesas de hospedagem, alimentação e transporte dos competidores, mas disponibilizará uma área para acantonamento.
Haverá quem diga que sempre foi assim, que é salutar a competição, que a premiação estimula e aumento o nível dos concorrentes. Assim como também há os fatores incentivo e fomento à cadeia produtiva da cultura.
Reconhecemos estas possibilidades, com certa tranqüilidade para adultos, pessoas com nível de desenvolvimento físico e intelectual completo. Tanto é que inúmeros projetos de Festivais, das mais diferentes modalidades artísticas, tem sido recomendados por este Conselho e considerados prioritários.
Entende esta conselheira que a realidade atual impõe que se reflita e que se tome atitude prática em relação à avaliação do mérito cultural de projetos de essencial caráter de competição.
A questão não é nova e sobre ela vários pensadores, pedagogos sociólogos já se debruçaram. Recentemente o assunto veio à tona na estréia do Masterchef Júnior, suscitando novamente o debate sobre a participação de crianças em programas de competição. Coleciono, em parte, artigo publicado no Jornal Zero-Hora (http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/noticia/2015/10/estreia-de-masterchef-junior-suscita-debate-sobre-participacao-de-criancas-em-programas-de-competicao-4884753.html#) sobre o tema, a título de informação, vejamos: Assim que MasterChef Júnior foi anunciado, imaginava-se que, por lidar com crianças entre nove e 13 anos, a versão do reality show de sucesso da Band teria uma rotação mais baixa do que sua edição para adultos. No original, as quase três horas de atração são recheadas por momentos de tensão, gritos e duras cobranças por parte dos jurados. No programa que estreou terça-feira, os chefs Erick Jacquin, Paola Carosella e Henrique Fogaça e a apresentadora Ana Paula Padrão, de fato, esforçam-se para trocar a exigência por afagos, a pressa por complacência, o clima pesado pela diversão. Mas, nas redes sociais, a atração acabou ensejando debates nada leves. Discute-se desde o perigo dos pequenos chefs "mexerem com faca e fogo" até a inadequação de vê-los envolvidos em uma competição, (...). A psicóloga Maria Lucia Stein, especialista em adolescentes, faz uma ponderação: — Competição existe em qualquer instância e é algo saudável em certo grau. Temos de pensar é na exposição na mídia, algo que pode ser prejudicial. O reconhecimento do fracasso e do sucesso, em uma criança com menos recursos para lidar com frustrações, pode trazer efeitos no desenvolvimento. Em um texto sobre o assunto, a jornalista Cássia Zanon, dona do blog Mãe de Proveta, reclama da exposição de "crianças sendo impelidas desde tão cedo (...) a dar tudo de si, não de uma maneira colaborativa (...), mas concorrendo a prêmios do tamanho de uma viagem a Disney com direito a cinco acompanhantes, só para não dizer que o prêmio é dinheiro" A preocupação não é só de Cássia, mãe de uma menina de três anos — a Comissão de Direitos Infanto juvenis da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo também olha atentamente para o reality. — Existem precauções que precisam ser tomadas: deve-se fazer um pedido antes de entrar no ar, explicando o tempo que vai tomar dessa criança, se vai ser possível conciliar com a escola, como aquilo vai contribuir para a formação. Aquelas crianças só estão lá porque foram autorizadas por um juiz. Mas como vamos mensurar a exploração da imagem? Imagina que ela minta, em determinado momento, sobre algum ingrediente. Tudo é potencializado, a opinião pública pode amar e odiar — avalia o presidente
No caso, vamos direcionar a argumentação para a questão da competição, obviamente incluída aí a exposição da criança.
A competição entre as crianças tem sido, inclusive, associada ao aumento da violência nas escolas. Em artigo publicado no sitio http://golfinho.com.br/artigo/ensinando-as-criancas-a-serem-pacificadoras.htm, em 17/03/2004, sob o título Ensinando as Crianças a serem Pacificadoras, Lauren Bradway, Ph.D., refere que com a erupção da violência nas escolas, os pais estão procurando aprender como ensinar as crianças a serem apaziguadoras. Um grande passo nessa direção será fazer com que nossas crianças aprendam a cooperar, ao invés de competir umas com as outras. O estudo se refere a sociedade americana, contudo nos serve de alerta, diante da identidade dos fatos. Reforça a autora que nós louvamos a competição e a encorajamos entre nossas crianças, já nos anos da pré-escola. A competição não é inocente, há perigos, sustenta Lauren: Em cada situação competitiva enfrentada por uma criança está a terrível realidade: "se ele ou ela ganhar, eu perco", Alfie Kohn em seu livro, "No Contest: the Case Against Competition" (ainda sem tradução - Sem disputar: O caso contra a Competição) insiste em que falar de "competição saudável" é uma contradição de termos. Não somente a competição não é saudável para as crianças, como veremos, mas também fomenta muitos perigos. Há uma grande diferença entre procurar sair-se bem e procurar sair-se melhor do que os outros. A competição pode produzir níveis de ansiedade inibidores. Crianças que têm sucesso nos debates, ou que ganham prêmios em competições musicais, por exemplo, muitas vezes o fazem por terem temperamento para suportar a pressão do evento, mais do que o talento para ganhar. A criança artística, sensível, pode se tornar incapaz de fazer as coisas, devido ao estresse da competição. Kohn cita pesquisa mostrando que crianças que tomam aulas de arte e competem por prêmios mostram menos criatividade do que aquelas que não competem. Não há dúvida de que isso se deve ao fato de que essas crianças correm menos riscos ao produzir obras de arte que elas esperam agradar os juízes mais do que a si próprias. Conforme a citada autora, a competição é uma "vaca sagrada" em nossa sociedade. Nós nos agarramos à crença de que ela forma o caráter quando, de fato, existem evidências de que o que ela forma são ressentimentos. A mestra apresenta a provocação, o que podemos fazer quanto a isso? Sugere a mudança de regras para os jogos favoritos, de modo que todas ganhem, também o encorajamento para que a criança se envolva em projetos comunitários, que recompensa a cooperação. As crianças devem ser elogiadas pelo que são mais do que por uma determinada realização. Sugere que se retire a ênfase das estrelas de ouro e notas e se enfatize o autoconhecimento, a empatia pelos outros e a alegria de aprender. Devemos ensinar as "novas regras básicas" das habilidades que as crianças precisam para alcançar sucesso no século XXI: respeito por si mesmo e pelos outros, capacidade de trabalhar em cooperação, capacidade de administrar a raiva, e a compreensão de que a violência sob qualquer forma é inaceitável. Ressalta que o aprendizado cooperativo dá suporte a pacificação e que se continuarmos a patrocinar a competição, jamais teremos sucesso em ensinar nossas crianças a serem apaziguadoras. Como sociedade, devemos entender que não podemos ter uma coisa se insistirmos em manter a outra.
Ainda, quanto a premiação em dinheiro, verifico que o item 1.50 da planilha de custos, traz o valor total de R$ 35.071,46 para esta rubrica, sendo que, os valores pagos individualmente constam no anexo I ao regulamento.
Constam no anexo I valores diferenciados por vencedor em cada categoria, por exemplo dança de salão mirim, 1º lugar R$ 300,00; e dança de salão adulta, 1º lugar R$ 700,00, em ambos os casos com descontos de IR de 30%. O que, para dizer o menos, se poderia considerar discriminatório, pois se estaria considerando, s.m.j, que o concorrente com maior idade (adulto) apresenta maior capacidade artística do que o de menor idade. Contudo os valores pagos aos jurados das diferentes categorias é o mesmo, R$ 2.500,00 para cada um, o que comprova o mesmo nível de exigência, em tese.
Ademais em se tratando de criança, especialmente as menores de 14 anos, os valores de premiação são recebidos e administrados pelos pais, podendo inclusive, ser equiparado a trabalho infantil, como vem sendo tratada a matéria pela Justiça do Trabalho e Ministério Público. Vejamos exertos do artigo publicado na Revista http://www.publicadireito.com.br/publicacao/uninove/livro.php?gt=196,: “Tem-se assim que, com o capitalismo, tudo deve resultar em dinheiro, o que antes era motivo de discriminação e preconceito, passa a ser fonte de renda e lucro. (...) Desta forma, é fácil perceber que existem outros motivos que influenciam o labor infantil no meio artístico. É o que afirma Vila Nova (2005) citada por Cavalcante (2011). Além de ser um trabalho mais bem remunerado do que o, clássico‟ trabalho infantil, o trabalho artístico tem outras motivações não financeiras, como a vaidade dos pais e a ideia de que „se dar bem na vida é conseguir sucesso e fama. (VILA NOVA, 2005 apud CAVALCANTE, 2011, p. 48). É nesse contexto que a exploração do trabalho infantil acontece e passa, por muitas vezes, despercebida por todos. “Afinal, ninguém pensa, ao ver a leveza da bailarina, que seus pés doem muito (...) que os ombros do pianista latejam de dor ao executar aquela linda música (...)” (CAVALCANTE, 2011, p. 48). O trabalho artístico de um modo geral requer muito treinamento e dedicação, assim como todas as profissões tidas como intelectuais, cujo esforço não é visto por aqueles que apenas veem o produto final. Em relação ao trabalho realizado por crianças e adolescentes, esse esforço dobra já que trata-se de um sujeito mais frágil que se cansa e se irrita com mais facilidade (CAVALCANTE, 2011).
(...) Tal exploração foi constatada por Sandra Regina Cavalcante ao realizar entrevistas para escrever o seu livro Trabalho Infantil em atividades artísticas: do deslumbramento à Ilegalidade, constatando a realidade desse ambiente de trabalho ouviu relatos de crianças cansadas, perdendo aulas, mães cobrando dos filhos desempenho, esforço, jornadas de trabalho dignas de um adulto. Sem acompanhamento psicológico, fiscalização do Ministério Público ou autorização judicial, crianças ficam 12 horas a disposição da produtora/emissora, às vezes com alimentação, outras não, às vezes de madrugada, às vezes com gente bem humorada outras não. (CAVALCANTE, 2011, p. 49). (...) Assim, o trabalho infantil artístico afronta os princípios consagrados pelas normas internacionais dos direitos humanos, como por exemplo, o art. 9º da Declaração dos Direitos da Criança, qual seja, o direito da criança de ser protegida contra a exploração no trabalho, citado por Piovesan e Luca (2010, p. 365) “em caso algum será permitido que a criança dedique-se, ou a ela se imponha, qualquer ocupação ou emprego que possa prejudicar sua saúde, sua educação, ou impedir seu desenvolvimento físico, mental ou moral”.
Se poderia, neste ponto, sugerir a utilização de um critério igualitário aos participantes, que assim prefiro denominar ao invés de competidores. No sentido de estimular a participação e não simplesmente a competição. Em alguns festivais a ajuda de custo foi a melhor forma encontrada de modo a estimular a participação dos pré-selecionados. Evidentemente é o pensamento desta conselheira, que de forma alguma tem o condão de pretender dirigir a formatação de futuros projetos.
Entendo relevante ressaltar que, ainda que não vinculado aos ditames da IN 01/2016, quanto aos limites de financiamento, o presente projeto se mostra extremamente e injustificadamente oneroso para os fins buscados. Exemplifico com a soma dos valores propostos dos itens 1.20 a 1.49, que se referem a cobertura fotográfica, locação banheiros, locação de palco, locação de estrutura metálica, locação de equipamento de iluminação, operador de iluminação, técnico de iluminação, locação de equipamento de sonorização externo, operador de sonorização, locação de tablado, locação de pavilhão, locação de estrutura palco externo, técnico iluminação palco externo, operador de sonorização palco externo, locação de tablado danças de salão, locação de grades de proteção, projeto de iluminação carregadores, eletricista, locação de gerador, locação de pirâmides, alimentação para equipe de trabalho, técnica e artistas, lanches camarim, hospedagem para equipe de produção e artistas e confecção de troféus, portanto, basicamente, estruturas, que resultaram na quantia de R$ 151.500,00 dum total de R$ 355.277,46.
Tenho afirmado a necessidade da busca do espírito da Lei de Incentivo à Cultura, através da análise minuciosa dos critérios legais, especialmente quando se avalia o mérito cultural dos projetos; sob pena de configurar “incentivo à estrutura”.
Refresco a memória transcrevendo o contido na RESOLUÇÃO Nº 003/2007/CEC:
“Art. 1º “Os projetos culturais de qualquer natureza submetidos à apreciação do Conselho Estadual de Cultura serão examinados, segundo a política cultural do Estado do Rio Grande do Sul, em duas etapas: I - quanto ao mérito (oportunidade e relevância), por um Conselheiro Relator, ao qual caberá, mediante Parecer, recomendá-lo ou não”.
O art. 2º elenca os critérios para exame do mérito, no caso, cito os seguintes: II - democratização da cultura e tratamento igualitário a todas as áreas e segmentos culturais; IX - resgate e pesquisa dos valores culturais; X - incorporação de novas formas de expressão; XI - conteúdo educativo; XII - divulgação e difusão de fatos históricos significativos; (...) XV - contrapartida pela utilização de recursos públicos, expressa em compensação material e/ou de fruição social ao Estado e à coletividade, observados a proporção dos valores aplicados, os meios de distribuição, a destinação e as características de abrangência de cada projeto; XVI - cumprimento do Art. 7º, XI, da Constituição do Estado, quanto aos bens produzidos sob remuneração ou custeio público, direto ou indireto; XVII - clareza de objetivos, adequação e enquadramento dos diversos aspectos do projeto, em especial quanto: a) às finalidades específicas de leis como a de Financiamento e Incentivo às Atividades Culturais; (...)
Quanto a resolução remete ao o art. 7º, XI, da CF, quer dizer que são bens do Estado: XI - os inventos e a criação intelectual surgidos sob remuneração ou custeio público estadual, direto ou indireto.
Assim, todo o cuidado é pouco quando se trata de recomendar ou não recomendar a aplicação de verbas públicas.
Portanto quando se recomenda e prioriza um projeto há que se considerar que este passará a ser bem do Estado.
Se tratando de conceitos indeterminados, a interpretação dos critérios tendem a variar no tempo e no espaço, conforme as políticas de Estado, necessidades e adequações ao momento social.
Assim, no meu sentir, também não vislumbro no caso o atendimento ao contido especialmente no inciso XV da Resolução n. 003/2007, relacionado à proporção dos valores aplicados.
Apenas ratificando e finalizando, é necessário, olhar diferente para as diferentes situações. Patrocinar a competição entre crianças, no meu entender, não é saudável. Mais grave ainda, se premiadas em dinheiro através do financiamento público.
Não poderia deixar de citar Paulo Freire quando refere que homens e mulheres não apenas estão no mundo, mas “com o mundo”, nessa relação homem/mundo ocorrem atos de criação e recriação permanentes, daí porque, se a compreensão do mundo for crítica, a ação será crítica e transformadora, se for mágica ou ingênua, assim também será sua ação no mundo.
Cabe lembrar que os profissionais participantes do presente projeto na condição de proponentes, apresentadores, jurados, artistas, bem como equipes de som e iluminação, tem tido sua competência e comprometimento com a atividade cultural deste Estado, reconhecida ao longo dos anos. Fazem prova disto os inúmeros projetos já aprovados e priorizados, tanto por esta conselheira como pelo DD. Conselho de Cultura do RS.
Contudo, neste caso, a fundamentação invocada está a indicar a não recomendação do presente projeto.
3. Em conclusão, o projeto “Rincão da Dança Gaúcha 1ª Edição” não é recomendado para a Avaliação Coletiva.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2016.
Alessandra Carvalho da Motta
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
Sessão das 10 horas do dia 11 de agosto de 2016.
Presentes: 22 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Jaime Antônio Cimenti, Ivo Benfatto, Paula Simon Ribeiro, José Mariano Bersch, Luiz Armando Capra Filho, Élvio Pereira Vargas, Antônio Carlos Côrtes, Erika Hanssen Madaleno, Marco Aurélio Alves, Gilberto Herschdorfer, Maria Silveira Marques, Ieda Gutfreind, Rafael Pavan dos Passos, Luiz Carlos Sadowski da Silva, Marlise Nedel Machado, Luciano Fernandes, Vinicius Vieira, Lucas Frota Strey, André Venzon e Walter Galvani.
Dael Luis Prestes Rodrigues
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