O projeto “O FESTIVAL DE DANÇA, CHULA E DECLAMAÇÃO DE MARAU”, em grau de recurso, não é acolhido.
1. O projeto cultural Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau, está apresentado pelo produtor Assoriana – Associação de Cultura, Eventos e Promoções, inscrito no CEPC sob o número 548, e é um evento não vinculado à data fixa. Está inscrito na categoria Artes Integradas e é orçado em R$ 446.565,64 (quatrocentos e quarenta e seis mil, quinhentos e sessenta e cinco reais e sessenta e quatro centavos). Na equipe principal constam José Oliveira Estivalet na função de produtor executivo e apresentador, Beloni da Silva Bastos na coordenação artística, MJ Produtora de Eventos Ltda na coordenação geral e Cristiane M de Araujo como contadora.
O projeto, em sua apresentação, afirma que o Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau é um evento competitivo destas três modalidades artísticas já indicadas em seu nome acrescido de danças tradicionalistas de salão, ocorrendo anualmente na cidade de Marau desde o ano de 2014. Trata-se de um evento extensivo a competidores de todo o Rio Grande do Sul. Em sua terceira edição, terá a adesão da modalidade danças de salão. Modalidades: 04 palcos abrigarão as competições de Danças Tradicionais (categorias pré-mirim, mirim, juvenil, adulta e veterana), Chula (categorias mirim, juvenil, adulta e veterana), Declamação (categorias peão mirim, peão juvenil, peão adulto, prenda mirim, prenda juvenil e prenda adulto) e Danças de Salão (categorias mirim, juvenil e adulta). Premiação: Serão premiados os 05 primeiros colocados de cada categoria em cada uma das modalidades, totalizando 90 premiações em dinheiro e troféus. Avaliação: Os regulamentos para os concursos serão confeccionados de acordo com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo Regulamento Artístico do MTG do Estado do Rio Grande do Sul. Local: CTG Felipe Portinho em Marau/RS, espaço cedido conforme locação e autorização em anexo ao projeto. Shows: Em cada uma das noites de realização do evento acontecerá apresentação musical com músico consagrado do RS, sendo eles Elton Saldanha e Mano Lima. Inscrições: As inscrições ocorrerão a partir de 30 dias de antecedência ao evento e deverão ser enviadas para e-mail específico criado especialmente para tal função. O número de inscrições será limitado a 20 por modalidade e categoria, tanto em grupos quanto em competidores individuais. Cada entidade poderá inscrever até 02 competidores nas categorias individuais por modalidade e categoria. Para as Danças Tradicionais será aceita a inscrição de 01 grupo por categoria.
Obs.: Na apresentação, cada participante deverá portar o seu cartão tradicionalista. Poderão participar da competição, representantes de entidades tradicionalistas de todo o estado do Rio Grande do Sul, desde que devidamente filiadas ao Movimento Tradicionalista Gaúcho.
O projeto foi relatado e aprovado por unanimidade do Conselho Estadual de Cultura. Em seu parecer, a conselheira relatora afirma: “Sabe-se que a premiação em dinheiro traz em seu bojo um atrativo aos concorrentes, contudo, há que se fazer uma séria reflexão ao oferecimento de prêmio em dinheiro para crianças e adolescentes. (...) Haverá quem diga que sempre foi assim, que é salutar a competição, que a premiação estimula e aumenta o nível dos concorrentes, assim como também há os fatores incentivo e fomento à cadeia produtiva da cultura.”.
Mas estamos reconhecendo estas possibilidades, com certa tranquilidade, para adultos, pessoas com nível de desenvolvimento físico e intelectual completo. Tanto é que inúmeros projetos de festivais das mais diferentes categorias artísticas tem sido recomendados por este Conselho e considerado prioritários.
Entende a conselheira que a realidade atual impõe séria reflexão e atitude prática em relação à avaliação do mérito cultural de projetos de essencial caráter de competição.
“A questão não é nova e sobre ela vários pensadores, pedagogos sociólogos já se debruçaram.”
“A psicóloga Maria Lucia Stein, especialista em adolescentes, faz uma ponderação:
— Competição existe em qualquer instância e é algo saudável em certo grau. Temos de pensar é na exposição na mídia, algo que pode ser prejudicial. O reconhecimento do fracasso e do sucesso, em uma criança com menos recursos para lidar com frustrações, pode trazer efeitos no desenvolvimento.”
“A competição não é inocente, há perigos, sustenta Lauren: Em cada situação competitiva enfrentada por uma criança está a terrível realidade: "se ele ou ela ganhar, eu perco". Alfie Kohn em seu livro, "No Contest: the Case Against Competition" (ainda sem tradução - Sem disputar: O caso contra a Competição) insiste em que falar de "competição saudável" é uma contradição de termos. Não somente a competição não é saudável para as crianças, como veremos, mas também fomenta muitos perigos.”
“Kohn cita pesquisa mostrando que crianças que tomam aulas de arte e competem por prêmios mostram menos criatividade do que aquelas que não competem. Não há dúvida de que isso se deve ao fato de que essas crianças correm menos riscos ao produzir obras de arte que elas esperam agradar os juízes mais do que a si próprias.”
“Conforme a citada autora, a competição é uma “vaca sagrada” em nossa sociedade. Nós nos agarramos à crença de que ela forma o caráter quando, de fato, existem evidências de que o que ela forma são ressentimentos.” Crianças que ficam com raiva ou deprimidas são as que enfrentam espancamento quando aparecem em casa com um boletim mostrando notas abaixo do desejável, ou não conseguem um troféu para seu projeto de ciências. São essas as crianças que correm perigo de agir sob a influência de seus ressentimentos, quem sabe até ao ponto de violência.
A conselheira relatora conclui esse parecer afirmando que diante de tantos fundamentos, assim como as autoras do citado trabalho científico, entende que não podemos vendar os olhos para o que ocorre no nosso meio.
É necessário, efetivamente, olhar diferente para essa situação, e não nos acovardar por achar que o dinheiro, a fama e o sucesso apagam a exploração sofrida pela criança e pelo adolescente. Crianças não são objetos, mercadorias a serem consumidas, são seres em processo de desenvolvimento, não podendo assumir responsabilidades de adulto.
Penso que a omissão ao enfrentamento destas questões pode trazer irremediáveis prejuízos. Acredito que se puderem ser evitados, através da reflexão que hora se põe, ainda que em relação a uma só criança, já terá valido a pena.
As inadequações, especialmente quanto ao caráter essencial de competição e premiação em dinheiro para as categorias com idade até, no mínimo 14 anos, a meu ver, são insuperáveis, de modo que não há como diligenciar no sentido da sua correção, o que desaguaria em formulação, na realidade, de um novo projeto.
O proponente apresentou recurso afirmando que: “Inicialmente somos compelidos a enunciar que não compartilhamos a opinião da Conselheira, quando ele afirma que a "competição" entre crianças e adolescentes, de forma geral, está diretamente associada ao aumento da violência juvenil. Será que esta alusão não estaria levando em consideração, tão somente, algum levantamento científico, resultante de pesquisas de opinião carentes de credibilidade?
Parece-nos, no entanto, que este suposto comportamento hostil não se reflete no cenário do qual fazem parte os concursos e eventos que valorizam e propagam a cultura e a tradição do Rio Grande do Sul. Preferimos acreditar que eventuais posturas violentas de uma ou outra criança, resultam, principalmente, do ambiente no qual elas vivem e/ou são criadas.
Não é demasiado imaginar que os principais aspectos que proporcionam fortuitos deslizes negativos de conduta por parte dos filhos, são a frequente ausência (física e intelectual) dos pais, consorciada à falta de educação e de disciplina das crianças. Bem ao contrário do que ocorre nos rodeios e concursos tradicionalistas, nos quais o participante tem que, obrigatoriamente, seguir regras que determinam um conjunto de quesitos a serem obedecidos, desde o modo correto de se vestir até a maneira adequada de se comportar. Conceitos como respeito, coleguismo, parceria e amizade são notoriamente estimulados por instrutores e pelos pais que, como diz a própria Conselheira, são acompanhantes permanentes das prendinhas e dos peões inscritos nesses concursos artísticos.
Ela alega ainda que, pelo fato de serem os pais desses destaques infanto-juvenis os recebedores e, consequente, administradores dos valores das premiações, estaria configurada uma involuntária situação de exploração do trabalho infantil. De nossa parte, preferimos analisar este contexto sob um outro prisma, que se coloca ao arrepio da argumentação da Conselheira.
Nosso enfoque é de que, na verdade, esses valores, em geral muito reduzidos, são na prevalência absoluta das vezes, direcionados ao custeio de despesas de locomoção e até mesmo para aquisição de artigos inerentes à indumentária do próprio concorrente ocasionalmente premiado, jamais para deleite de seus responsáveis. Estes, inclusive, no mais das vezes, são os que patrocinam seus filhos nestas atividades, prazerosas e formadoras de conceitos importantes para estas crianças, adverso ao que afirma a Conselheira.
Outro equívoco da nobre conselheira, na nossa maneira de ver, é comparar um concurso de arte regional gaúcha, programado para acontecer num pequeno município do interior do estado, com um espetáculo de TV, estilo reality show. É notório que estas produções televisivas, além de oferecerem altíssimas premiações aos vencedores, os obriga muitas vezes, a comportarem-se de maneira fantasiosa, com o objetivo pré-determinado de provocarem situações por vezes embaraçosas e até mesmo polêmicas, que ocasionem aumento de audiência e de popularização do programa. Além disso, estes infantes são expostos em horário nobre numa emissora de abrangência nacional, com milhares de telespectadores, tornando-os alvos dos mais variados tipos de julgamento. Diante deste contexto, é possível imaginar que estes atrativos possam vir a ser incentivadores da não autenticidade e de equívocos de comportamento. E, ainda assim, seria temerário sancionar este parecer.
Já nos rodeios, festivais e concursos artísticos que se sucedem quase que semanalmente no Rio Grande do Sul, o que se percebe são participantes e competidores seguindo normas regimentais, conhecidas por todos que frequentam esses encontros. Tais regras incentivam os concorrentes a valorizarem o sentido de conjunto, a solidariedade e a igualdade de condições entre todos, penalizando, inclusive, os que têm comportamentos divergentes. Evidentemente que nas modalidades individuais existem aqueles que se destacam por serem mais talentosos ou mais preparados, mas não a ponto de tornarem-se arrogantes ou demonstrarem menosprezo em relação a seus companheiros de disputa.
Reputar estas competições que oferecem premiações a grupos ou destaques individuais como causa para sazonais alterações de conduta, ou ainda, timbrá-los como ingredientes geradores de violência, nos parece um grande exagero.
Reportando-nos ainda a questão dos valores endereçados as premiações dos concorrentes infanto-juvenis, gostaríamos de ratificar a digníssima conselheira relatora, total liberdade para readequar as rubricas em debate ou até mesmo glosá-las da planilha de custos, se esta medida contribuir para reestabelecer o prosseguimento normal da nossa demanda no âmbito desse seleto conselho.
É imperioso reiterarmos o referido projeto está cadastrado no Sistema desde 06/10/2015, e que por esta razão formou-se, no seio da comunidade do município de Marau, uma imensa e positiva expectativa em torno da execução do festival, por se tratar de um evento tradicional, que mobiliza àquela coletividade, proporcionando entretenimento e gerando emprego e renda para muitas pessoas.
Finalizamos deixando claro que compreendemos o significativo volume de incumbências impostas aos laboriosos integrantes do Conselho Estadual de Cultura, mesmo assim, não podemos omitir nosso intuito de reivindicar uma atenção especial da parte dos Conselheiros, para os argumentos por nós elencados, ao mesmo tempo em que solicitamos que o projeto cultural Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau - 3ª Edição tenha uma nova oportunidade e seja reconduzido à análise e posterior avaliação coletiva.”
É o relatório.
2. Este conselheiro intencionalmente reproduz aqui a apresentação do projeto, partes do parecer da conselheira relatora assim como a integralidade do conteúdo do recurso apresentado pelo proponente considerando que, após a apresentação e votação do relatório original este Conselho recebeu 16 novos integrantes que assumiram suas funções. Por esta razão, reproduzimos o conteúdo de ambas as peças integrantes deste processo. Não fosse a necessidade de inteirar os novos conselheiros este parecer seria sintético contendo apenas a informação de que o recurso não é acolhido considerando não ter apresentado nenhum elemento novo que permita repensar o brilhante parecer da conselheira relatora.
Quanto à apresentação do projeto e parecer ao pleno do CEC, esse conselheiro acompanhou o voto da relatora e, não bastasse, sugeriu que esta fosse a base para que o CEC elabore Resolução aproveitando tal conteúdo. Por esta razão, desnecessário dizer que concordo integralmente com tudo o que foi apresentado no parecer original.
O recurso apresentado pelo proponente evidencia que o mesmo não soube compreender que quando um parecer é aprovado pela unanimidade de seus integrantes, se apresentar recurso deverá considerar elementos despercebidos pelo relator que tenham resultado em equivoco dos conselheiros. Não foi o que ocorreu aqui.
Este Conselho não está interessado apenas no fenômeno da eventologia que marca a maioria das solicitações encaminhadas ao Sistema Pró-Cultura, mas sim com a política cultural do Rio Grande do Sul. Quando o proponente afirma na apresentação de seu projeto que o evento reunirá "competidores", cria ali uma dificuldade para sua aprovação. Existem segmentos ou áreas onde a competição é fator motivador de resultados. Porém, nos processos ou projetos artísticos e culturais esse termo deve ser varrido do dicionário. Além disso, os parcos recursos públicos destinados à cultura devem ser investidos no fomento, no incentivo, na formação, na difusão, na circulação, na promoção, na inovação, na pesquisa e em tudo o que preconizam os Planos Nacional e Estadual de Cultural. Sugerimos que todos os produtores leiam tais instrumentos antes de encaminharem seus projetos considerando que nem tudo que está permitido é meritório ou oportuno ou prioritário.
O proponente ocupou seu recurso objetivando contrapor aquilo que está apresentado pela relatora sem apresentar solução ao apresentado. Beira o absurdo a afirmação do proponente que diz: “será que esta alusão não estaria levando em consideração, tão somente, algum levantamento científico, resultante de pesquisas de opinião carentes de credibilidade?” Ora, a conselheira relatora apresentou estudos científicos embasados, citando fontes e autores especializados credenciados. Inexiste no recurso qualquer elemento além da opinião do proponente. Inexiste no recurso a menção de estudo ou pesquisa, mesmo que "carente de credibilidade".
Ainda que desnecessário, com o intuito de contribuir na análise do projeto, incluo um breve comentário da oportunidade, relevância e mérito do projeto.
Um projeto que mira apenas na competição e é orçado em R$ 446.565,64 (quatrocentos e quarenta e seis mil quinhentos e sessenta e cinco mil e sessenta e quatro centavos) não é oportuno.
Irrelevante um projeto que está descasado da comunidade em que está inserido. Inexiste nos anexos do projeto qualquer documento firmado pelos CTGs ou Conselho Municipal de Cultura ou Prefeitura Municipal que afirme a importância deste projeto para aquela comunidade. Os projetos financiados pelo Sistema Pró-Cultura devem movimentar a cadeira da economia da cultura, mas não ter apenas o caráter meramente comercial.
Por último, carece de mérito uma iniciativa que não reconhece que o valor maior de uma iniciativa artística ou cultural consiste na preservação ou recuperação dos valores humanitários e não é através de normas comportamentais ou competições que reconstruiremos as pontes que permitirão que crianças, adolescentes, adultos e idosos descubram e desfrutem do saboroso prazer da convivência fraterna.
3. Em conclusão, o projeto “O Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau”, em grau de recurso, não é acolhido.
Porto Alegre, 03 de setembro de 2016.
Marco Aurélio Alves
Conselheiro Relator
Informe:
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
Recurso não acolhido pelo Pleno
Sessão das 13h30min do dia 05 de setembro de 2016.
Presentes: 21 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Jaime Antônio Cimenti, Ivo Benfatto, Paula Simon Ribeiro, José Mariano Bersch, Luiz Armando Capra Filho, Élvio Pereira Vargas,Erika Hanssen Madaleno, Dael Luis Prestes Rodrigues, Maria Silveira Marques, Ieda Gutfreind, Marlise Nedel Machado, Luciano Fernandes, André Venzon e Walter Galvani.
Abstenções: Luiz Carlos Sadowski da Silva, Lucas Frota Strey, Gilberto Herschdorfer, Vinicius Vieira e Rafael Pavan dos Passos.
Antônio Carlos Côrtes
Conselheiro Presidente do CEC/RS
O projeto “FESTIVAL DE DANÇA, CHULA E DECLAMAÇÃO DE MARAU 3ª EDIÇÃO 2016” não é recomendado para a avaliação coletiva.
1. O projeto “FESTIVAL DE DANÇA, CHULA E DECLAMAÇÃO DE MARAU 3ª EDIÇÃO 2016”, evento não vinculado a data fixa, é um evento competitivo destas três modalidades artísticas, incluída a dança de salão nesta 3ª edição. Pertence a área de artes integradas e ocorre anualmente na cidade de Marau desde 2014. Recebe competidores de todo o RS, os 4 palcos abrigarão as competições nas categorias pré-mirim, mirim, juvenil, adulta e veterana; chula nas categorias mirim, juvenil, adulta e veterana e declamação nas categorias peão mirim, peão juvenil, peão adulto, prenda mirim, prenda juvenil e prenda adulta e danças de salão (categorias mirim, juvenil e adulta). Serão premiados os 5 primeiros colocados de cada categoria em cada modalidade, totalizando 90 premiações, em dinheiro e troféus. Os regulamentos dos concursos serão confeccionados de acordo com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo Regulamento Artístico do MTG do RS. O evento ocorrerá no CTG Felipe Portinho em Marau/RS, espaço cedido conforme locação e autorização firmadas. Em cada uma das noites do evento acontecerá apresentação musical com músico consagrado do RS, Elton Saldanha e Mano Lima. As inscrições ocorrerão com 30 dias de antecedência e serão enviadas por email, o número será limitado a 20 por modalidade e categoria, tanto nos grupos quanto em competidores individuais. Cada entidade poderá inscrever até 2 competidores nas categorias individuais por modalidade e categoria. Para as Danças Tradicionais será aceita a inscrição de 1 grupo por categoria. Os participantes deverão portar o seu cartão tradicionalista. Poderão participar da competição, representantes de entidades tradicionalistas de todo o Estado do Rio Grande do Sul, desde que devidamente filiadas ao Movimento Tradicionalista Gaúcho. Sustenta o proponente que com a realização deste evento a cultura tradicional gaúcha torna-se protagonista em um espaço/tempo determinados pelas atividades do projeto, assim promovendo o desenvolvimento cultural do estado. Eventos como este, que trazem em sua essência a confraternização e integração entre admiradores e praticantes da cultura tradicional gaúcha, permitem que artistas, público e seus colaboradores acessem um imenso acervo cultural e histórico, em um importante processo de valorização das suas tradições. São fundamentais para o sucesso do evento uma boa estrutura, equipamentos de som e luz com qualidade, artistas populares e, principalmente, o acesso democrático as atividades propostas, tendo todas elas de classificação livre e entrada franca. Dentre os objetivos específicos estão: agregar em um só evento as danças a chula e a declamação, promover o intercâmbio cultural e incentivar a competição saudável, proporcionar uma programação cultural de qualidade, com classificação livre e entrada franca, realizar apresentações musicais de dois artistas ícones da música nativista gaúcha e afirmar ao público valores da história e tradição gaúcha. O evento espera 3.000 pessoas, em 2016 o evento será realizado pela Açoriana Associação de Cultura, Eventos e Promoções. A proponente anterior, em virtude de projetos ativos no sistema LIC, está impossibilitada para proposição de novos projetos. Salienta o proponente que o evento será amplamente divulgado também através de material gráfico como flyers, folders, cartazes, e faixas afixadas no entorno do local do evento. Pretende realizar um momento de integração para os grupos competidores, quando dançam entre si, trocando os pares, este momento é também bastante apreciado pelo público. O proponente em relação ao Plano de redução de impacto ambiental afirma que o local contém banheiros próprios, bem como lixeiras e equipe de limpeza. O valor proposto do projeto e habilitado sem alterações pelo SAT é de R$ 446.565,64, tendo como fonte de financiamento unicamente o Sistema LIC.AT é de R$ 79.004,80, tendo como fonte de financiamento o Sistema LIC.
2. Primeiramente, verifico que o evento está em sua 3ª Edição, tendo referido o proponente que em 2016 o evento será realizado pela Açoriana Associação de Cultura, Eventos e Promoções, pois a proponente anterior, em virtude de projetos ativos no sistema LIC, está impossibilitada para proposição de novos projetos.
Quanto a esta informação, verifico inexistir irregularidade na apresentação do projeto por outro proponente, pois o relatório físico da 2ª edição do evento- 2015 foi entregue em 20/07/2015, respeitado assim o § 3º do art. 4º da IN n. 01/2014.
Conforme relata o proponente o Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau é um evento competitivo das modalidades artísticas: danças tradicionais, chula, declamação e danças de salão, que abrangerão as categorias pré-mirim, mirim, juvenil e adulta, que serão abrigadas em 4 palcos a dizer: Danças Tradicionais (categorias pré-mirim, mirim, juvenil, adulta e veterana), Chula (categorias mirim, juvenil, adulta e veterana), Declamação (categorias peão mirim, peão juvenil, peão adulto, prenda mirim, prenda juvenil e prenda adulto) e Danças de Salão (categorias mirim, juvenil e adulta) .
Há previsão de premiação para os 5 primeiros colocados de cada categoria em cada uma das modalidades, totalizando 90 premiações em dinheiro e troféus.
O regulamento para os concursos será confeccionado de acordo com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo Regulamento Artístico do MTG do Estado do Rio Grande do Sul.
Adverte o proponente que na apresentação, cada participante deverá portar o seu cartão tradicionalista e que poderão participar da competição, representantes de entidades tradicionalistas de todo o Estado do Rio Grande do Sul, desde que devidamente filiadas ao Movimento Tradicionalista Gaúcho.
Conforme se nota, há uma estreita vinculação do projeto com as diretrizes e critérios estabelecidos pelo regulamento artístico do MTG.
É de conhecimento público que os Festivais competitivos se multiplicaram nos últimos anos, merecendo atenção da mídia e dos responsáveis pela produção cultural do Estado.
É reconhecido o caráter eminentemente divulgador e mantenedor da cultura regional em eventos como o que se apresenta, contudo entendemos que merece a devida atenção quanto a importantes pontos que tem passado despercebido aos produtores.
Os Festivais e Rodeios Artísticos do RS, atualmente, apresentam evidente inspiração e regramento baseado no Encontro de Artes e Tradições Gaúchas, o ENART, realizado sobre a coordenação do Movimento Tradicionalista Gaúcho em parceria hoje com o Estado do RS, através da LIC e prefeitura de Santa Cruz do Sul. Considerado pela UNESCO como o maior Festival de Arte Amadora da America Latina, o evento envolve, ano após ano, milhares de pessoas, entre concorrentes, visitantes e organizadores, contando com investimento público, privado e de colaboradores não remunerados para a sua realização.
Transcrevo, no que importa para esta fundamentação, alguns artigos do citado Regulamento do ENART:
Art. 4º - Somente poderão participar do ENART aqueles concorrentes, incluindo seus músicos acompanhantes, que completarem 15 (quinze) anos de idade até o dia definido para o início da fase final.
(...)
Art. 70 - Nas duas etapas iniciais não haverá premiação.
Art. 71 - Na etapa final (ou finalíssima, se for o caso) os classificados em primeiro, segundo e terceiro lugares, em cada modalidade receberão troféus, com exceção do Grupo de Danças e das Trovas Galponeiras.
§ 1º - Todos os Grupos de Danças que se classificarem para a finalíssima receberão troféus de “FINALISTA”, que lhes serão entregues no momento do sorteio das danças.
§ 2º - Serão agraciadas, com troféus, de acordo com sua classificação, até o terceiro lugar, as coreografias de entrada e de saída.
§ 3º - Os Grupos Musicais, acompanhantes dos Grupos de Danças Tradicionais, serão premiados até o terceiro lugar, observado o artigo 26, § 6º deste Regulamento.
...
7º - Serão premiados com troféus, os 5 (cinco) primeiros colocados na modalidade Danças Tradicionais, força A e B, de acordo com a sua classificação, na finalíssima da última etapa.
§ 8º - O vencedor da modalidade, Chula, receberá além do troféu a lança que foi utilizada no ENART do respectivo ano.
§ 9º - Receberá troféu especial o Trovador mais popular na etapa final, aquele que obtiver o maior “aplauso” do público, sendo que a definição do vencedor será feita pela própria Comissão Avaliadora.
Art. 88 - É vedado aos promotores do ENART, em qualquer uma de suas etapas, o oferecimento de prêmios em dinheiro a qualquer participante e sob qualquer circunstância.
Apenas a título informativo coleciono o artigo 5º do Regulamento artístico do MTG que elenca as categorias dos eventos artísticos, verbis:
Art. 5º -Nos eventos artísticos, os concursos poderão ser divididos por categorias, como segue:
I -Infantil -até nove (9) anos (não pode ter feito 10).
II -Mirim -até treze (13) anos (não pode ter feito 14).
III -Juvenil -até dezessete (17) anos (não pode ter feito 18).
IV -Adulta –mínimo de quinze (15) anos.
V -Veterano -mínimo de trinta (30) anos.
VI –Xirú –mínimo de quarenta (40) anos.
Bem, ao que tudo indica, as diretrizes e critérios que irão constar no regulamento do presente projeto, que será posteriormente formulado, dizem com o conteúdo artístico das apresentações, coreografia, música, etc, e, não com a premiação, porque conforme o Regulamento do MTG é vedado o oferecimento de prêmio em dinheiro.
Sabe-se que a premiação em dinheiro traz em seu bojo um atrativo aos concorrentes, contudo, há que se fazer uma séria reflexão ao oferecimento de prêmio em dinheiro para crianças e adolescentes.
Haverá quem diga que sempre foi assim, que é salutar a competição, que a premiação estimula e aumento o nível dos concorrentes. Assim como também há os fatores incentivo e fomento à cadeia produtiva da cultura.
Mas estamos reconhecendo estas possibilidades, com certa tranquilidade para adultos, pessoas com nível de desenvolvimento físico e intelectual completo. Tanto é que inúmeros projetos de Festivais das mais diferentes categorias artísticas tem sido recomendados por este Conselho e considerado prioritários.
Entende esta conselheira que a realidade atual impõe séria reflexão e atitude prática em relação à avaliação do mérito cultural de projetos de essencial caráter de competição.
A questão não é nova e sobre ela vários pensadores, pedagogos sociólogos já se debruçaram. Recentemente o assunto veio à tona na estréia do Masterchef Júnior, suscitando novamente o debate sobre a participação de crianças em programas de competição.
Coleciono, em parte, artigo publicado no Jornal Zero-Hora (http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/noticia/2015/10/estreia-de-masterchef-junior-suscita-debate-sobre-participacao-de-criancas-em-programas-de-competicao-4884753.html#) sobre o tema, a título de informação, vejamos:
Assim que MasterChef Júnior foi anunciado, imaginava-se que, por lidar com crianças entre nove e 13 anos, a versão do reality show de sucesso da Band teria uma rotação mais baixa do que sua edição para adultos. No original, as quase três horas de atração são recheadas por momentos de tensão, gritos e duras cobranças por parte dos jurados. No programa que estreou terça-feira, os chefs Erick Jacquin, Paola Carosella e Henrique Fogaça e a apresentadora Ana Paula Padrão, de fato, esforçam-se para trocar a exigência por afagos, a pressa por complacência, o clima pesado pela diversão. Mas, nas redes sociais, a atração acabou ensejando debates nada leves. Discute-se desde o perigo dos pequenos chefs "mexerem com faca e fogo" até a inadequação de vê-los envolvidos em uma competição, e comentários pedófilos no Twitter provocaram onda de reação em blogs e sites.
A produção do reality show afirma que todas as precauções para evitar possíveis problemas foram tomadas. No site oficial, o diretor Patrício Díaz explica que o programa "explora mais o lúdico, a surpresa e o divertimento, mas sem perder de vista a competição e a exigência culinária". A psicóloga Maria Lucia Stein, especialista em adolescentes, faz uma ponderação: — Competição existe em qualquer instância e é algo saudável em certo grau. Temos de pensar é na exposição na mídia, algo que pode ser prejudicial. O reconhecimento do fracasso e do sucesso, em uma criança com menos recursos para lidar com frustrações, pode trazer efeitos no desenvolvimento. (...) No episódio de estreia, não foram poucas as crianças que caíram no choro ao depararem com problemas nos pratos. Surpreendente, entretanto, foi a calma com que os eliminados deram depoimentos após sair. Aos gritos de "fica feliz" e "parabéns, você já é um vencedor", Hytalo, por exemplo, declarou: — Sou um dos 20 melhores cozinheiros júnior do Brasil. Hoje, não choro de triste. Choro de feliz. Porque foi uma coisa que consegui.
Em um texto sobre o assunto, a jornalista Cássia Zanon, dona do blog Mãe de Proveta, reclama da exposição de "crianças sendo impelidas desde tão cedo (...) a dar tudo de si, não de uma maneira colaborativa (...), mas concorrendo a prêmios do tamanho de uma viagem a Disney com direito a cinco acompanhantes, só para não dizer que o prêmio é dinheiro" (além da viagem e do troféu do MasterChef, o campeão ganha curso de culinária, vale-compras de R$ 1 mil por mês e kit de eletrodomésticos). A preocupação não é só de Cássia, mãe de uma menina de três anos — a Comissão de Direitos Infanto juvenis da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo também olha atentamente para o reality.
— Existem precauções que precisam ser tomadas: deve-se fazer um pedido antes de entrar no ar, explicando o tempo que vai tomar dessa criança, se vai ser possível conciliar com a escola, como aquilo vai contribuir para a formação. Aquelas crianças só estão lá porque foram autorizadas por um juiz. Mas como vamos mensurar a exploração da imagem? Imagina que ela minta, em determinado momento, sobre algum ingrediente. Tudo é potencializado, a opinião pública pode amar e odiar — avalia o presidente da Comissão, Ricardo de Moraes Cabezón.
(...) — Pode-se pedir uma indenização, caso haja danos à imagem, se a pessoa falou algo muito forte, que fez com que a criança tivesse que se submeter a terapia. Se houve ofensa, difamação, se a pessoa faz ameaça ou apologia ao estupro, estamos num outro plano de tipificação penal, que é muito mais grave, que pode levar à prisão — explica Ricardo Cabezón.
No caso, vamos direcionar a argumentação para a questão da competição, obviamente incluída aí a exposição da criança.
A competição entre as crianças tem sido, inclusive, associada ao aumento da violência nas escolas.
Em artigo publicado no sitio http://golfinho.com.br/artigo/ensinando-as-criancas-a-serem-pacificadoras.htm, em 17/03/2004, sob o título Ensinando as Crianças a serem Pacificadoras, Lauren Bradway, Ph.D., refere que com a erupção da violência nas escolas, os pais estão procurando aprender como ensinar as crianças a serem apaziguadoras. Um grande passo nessa direção será fazer com que nossas crianças aprendam a cooperar, ao invés de competir umas com as outras.
O estudo se refere a sociedade americana, contudo nos serve de alerta, diante da identidade dos fatos. Reforça a autora que nós louvamos a competição e a encorajamos entre nossas crianças, já nos anos da pré-escola. Por que, de outra maneira, escolheríamos "a melhor" fantasia do Dia das Bruxas numa festinha de crianças com 4 anos de idade? Por que, no Jardim da Infância, só damos figurinhas para as crianças que são capazes de escrever seus nomes e destacamos o ganhador no jogo da amarelinha?
A competição não é inocente, há perigos, sustenta Lauren: Em cada situação competitiva enfrentada por uma criança está a terrível realidade: "se ele ou ela ganhar, eu perco", Alfie Kohn em seu livro, "No Contest: the Case Against Competition" (ainda sem tradução - Sem disputar: O caso contra a Competição) insiste em que falar de "competição saudável" é uma contradição de termos. Não somente a competição não é saudável para as crianças, como veremos, mas também fomenta muitos perigos.
Crianças sem esperança de ganhar num teste de ortografia, de obter um lugar num brinquedo, ou de vencer num jogo, perdem a autoconfiança e desistem de tentar. A perda da autoestima leva à falta de disposição para aproveitar chances e arriscar fracassos futuros. Essas são as crianças que desaparecem nos cantos ou se viciam em televisão. São também as que comem muito, ou muito pouco, para manter a vida.
Há uma grande diferença entre procurar sair-se bem e procurar sair-se melhor do que os outros. A competição pode produzir níveis de ansiedade inibidores. Crianças que têm sucesso nos debates, ou que ganham prêmios em competições musicais, por exemplo, muitas vezes o fazem por terem temperamento para suportar a pressão do evento, mais do que o talento para ganhar. A criança artística, sensível, pode se tornar incapaz de fazer as coisas, devido ao estresse da competição.
Kohn cita pesquisa mostrando que crianças que tomam aulas de arte e competem por prêmios mostram menos criatividade do que aquelas que não competem. Não há dúvida de que isso se deve ao fato de que essas crianças correm menos riscos ao produzir obras de arte que elas esperam agradar os juízes mais do que a si próprias.
Conforme a citada autora, a competição é uma "vaca sagrada" em nossa sociedade. Nós nos agarramos à crença de que ela forma o caráter quando, de fato, existem evidências de que o que ela forma são ressentimentos. Crianças que ficam com raiva ou deprimidas são as que enfrentam espancamento quando aparecem em casa com um boletim mostrando notas abaixo do desejável, ou não conseguem um troféu para seu projeto de ciências. São essas as crianças que correm perigo de agir sob a influência de seus ressentimentos, quem sabe até ao ponto de violência.
A mestra apresenta a provocação, o que podemos fazer quanto a isso? Sugere a mudança de regras para os jogos favoritos, de modo que todas ganhem, também o encorajamento para que a criança se envolva em projetos comunitários, que recompensa a cooperação. As crianças devem ser elogiadas pelo que são mais do que por uma determinada realização. Sugere que se retire a ênfase das estrelas de ouro e notas e se enfatize o autoconhecimento, a empatia pelos outros e a alegria de aprender. Devemos ensinar as "novas regras básicas" das habilidades que as crianças precisam para alcançar sucesso no século XXI: respeito por si mesmo e pelos outros, capacidade de trabalhar em cooperação, capacidade de administrar a raiva, e a compreensão de que a violência sob qualquer forma é inaceitável.
Ressalta que o aprendizado cooperativo dá suporte a pacificação e que se continuarmos a patrocinar a competição, jamais teremos sucesso em ensinar nossas crianças a serem apaziguadoras. Como sociedade, devemos entender que não podemos ter uma coisa se insistirmos em manter a outra.
Ainda, quanto a premiação em dinheiro, verifico que o item 1.31 da planilha de custos, traz o valor total de R$ 70.785,64, impossibilitando verificar o quantum devido a cada vencedor.
A planilha de aplicação do mesmo projeto na edição de 2015 elenca valores diferenciados por vencedor em cada categoria, por exemplo chula adulta 1º lugar R$ 2.000,00 e chula mirim 1º lugar 1.142,86. O que, para dizer o menos, se poderia considerar discriminatório, pois se estaria considerando, s.m.j, que o concorrente com maior idade (adulto) apresenta maior capacidade artística do que o de menor idade. Contudo os valores pagos aos jurados das diferentes categorias é o mesmo, R$ 2.500,00 para cada um, o que comprova o mesmo nível de exigência, em tese.
Ademais em se tratando de criança, especialmente as menores de 14 anos, os valores de premiação são recebidos e administrados pelos pais, podendo inclusive, ser equiparado a trabalho infantil, como vem sendo tratada a matéria pela Justiça do Trabalho e Ministério Público. Vejamos exertos do artigo publicado na Revista http://www.publicadireito.com.br/publicacao/uninove/livro.php?gt=196,:
Reportando-se em especial, à questão do trabalho infantil, tema do presente trabalho, a Constituição Federal em seu art. 7°, inciso XXXIII, com alteração introduzida pela EC n° 20/1988, estabeleceu a proibição de “qualquer trabalho, a pessoas com idade inferior a 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos” (BRASIL, 1988).
Diante desse dispositivo, e realizando uma interpretação sistemática da norma, percebe-se a limitação da idade mínima, como regra de 16 anos, e como exceção, na condição de aprendiz, 14 anos de idade.
Pois bem, se a única exceção é a do aprendiz, como se explicaria o desenvolvimento de crianças com idade inferior à mínima em atividades artísticas, como, por exemplo, circo, publicidade, cinema, televisão e teatro?
A resposta está na Consolidação das Leis do Trabalho, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Convenção n. 138 da Organização Internacional do Trabalho que abrem ainda mais o leque de possibilidades de trabalho em idade inferior à mínima. Entre essas possibilidades, encontra-se a do trabalho infantil em atividades artísticas (OIT, 1973).
Entretanto, diante da realidade brasileira que mostra de forma bem clara a existência de várias formas de trabalho infantil, entre elas, o trabalho infantil no âmbito familiar, o trabalho infantil doméstico, o trabalho infantil em atividades ilícitas, o trabalho infantil rural e outros que exigem das autoridades e da própria sociedade um cuidado e uma atenção mais específica, muitas vezes, o trabalho infantil artístico, por aparentemente causar menos prejuízos e ser visto culturalmente de forma positiva pela sociedade, é colocado em segundo plano.
O presente trabalho tem por objetivo mostrar que existe sim, violação dos direitos humanos de crianças e adolescentes submetidas ao trabalho infantil artístico, principalmente no que tange à aplicabilidade da doutrina da proteção integral adotada no ordenamento brasileiro em detrimento da Convenção dos Direitos da Criança. Trazendo respostas paras as seguintes questões: A teoria da proteção integral tem sido eficaz na garantia de direitos das crianças e adolescentes que desenvolvem atividades artísticas no Brasil? Será que os direitos humanos desses menores são respeitados quando expostos às rotinas exaustivas de gravação e decoração de textos? Como mudar a visão da sociedade que aceita naturalmente o desenvolver desse trabalho precoce?
Tem-se assim que, com o capitalismo, tudo deve resultar em dinheiro, o que antes era motivo de discriminação e preconceito, passa a ser fonte de renda e lucro.
Assim, concluiu Cavalcante (2011) que ao final do século XX foi clara a mudança de comportamento, principalmente na classe urbana e dentro da própria família, passando agora, a sociedade não mais a reagir com críticas, mas, inclusive, incentivando e, muitas vezes, obrigando seus filhos a ingressar no mundo artístico.
Tal afirmação é perfeitamente comprovada na atualidade. Basta observarmos o comportamento do ser humano diante de uma possibilidade de ficar famoso, como o que ocorre, por exemplo, no reality show transmitido na emissora Globo de televisão Big Brother Brasil ou as filas gigantescas nos processos seletivos de modelo, atriz, cantor, entre outros.
Desta forma, é fácil perceber que existem outros motivos que influenciam o labor infantil no meio artístico. É o que afirma Vila Nova (2005) citada por Cavalcante (2011).
Além de ser um trabalho mais bem remunerado do que o „clássico‟ trabalho infantil, o trabalho artístico tem outras motivações não financeiras, como a vaidade dos pais e a ideia de que „se dar bem na vida é conseguir sucesso e fama. (VILA NOVA, 2005 apud CAVALCANTE, 2011, p. 48).
É nesse contexto que a exploração do trabalho infantil acontece e passa, por muitas vezes, despercebida por todos. “Afinal, ninguém pensa, ao ver a leveza da bailarina, que seus pés doem muito (...) que os ombros do pianista latejam de dor ao executar aquela linda música (...)” (CAVALCANTE, 2011, p. 48).
O trabalho artístico de um modo geral requer muito treinamento e dedicação, assim como todas as profissões tidas como intelectuais, cujo esforço não é visto por aqueles que apenas veem o produto final. Em relação ao trabalho realizado por crianças e adolescentes, esse esforço dobra já que trata-se de um sujeito mais frágil que se cansa e se irrita com mais facilidade (CAVALCANTE, 2011).
Tal exploração foi constatada por Sandra Regina Cavalcante ao realizar entrevistas para escrever o seu livro Trabalho Infantil em atividades artísticas: do deslumbramento à Ilegalidade, constatando a realidade desse ambiente de trabalho.
ouviu relatos de crianças cansadas, perdendo aulas, mães cobrando dos filhos desempenho, esforço, jornadas de trabalho dignas de um adulto. Sem acompanhamento psicológico, fiscalização do Ministério Público ou autorização judicial, crianças ficam 12 horas a disposição da produtora/emissora, às vezes com alimentação, outras não, às vezes de madrugada, às vezes com gente bem humorada outras não. (CAVALCANTE, 2011, p. 49).
Assim, o trabalho infantil artístico afronta os princípios consagrados pelas normas internacionais dos direitos humanos, como por exemplo, o art. 9º da Declaração dos Direitos da Criança, qual seja, o direito da criança de ser protegida contra a exploração no trabalho, citado por Piovesan e Luca (2010, p. 365) “em caso algum será permitido que a criança dedique-se, ou a ela se imponha, qualquer ocupação ou emprego que possa prejudicar sua saúde, sua educação, ou impedir seu desenvolvimento físico, mental ou moral”.
Se poderia, neste ponto, sugerir a utilização de um critério igualitário aos participantes que assim prefiro denominar ao invés de competidores. No sentido de estimular a participação e não simplesmente a competição, que vem sido adotado em alguns festivais, qual seja, a ajuda de custo para todos os inscritos classificados. Evidentemente é o pensamento desta conselheira, que de forma alguma tem o condão de pretender dirigir a formatação de futuros projetos.
Diante de tantos fundamentos, assim como as autoras do citado trabalho científico, entendo que não podemos vendar os olhos para o que ocorre no nosso meio.
Não poderia deixar de citar Paulo Freire quando refere que homens e mulheres não apenas estão no mundo, mas “com o mundo”, nessa relação homem/mundo ocorrem atos de criação e recriação permanentes, daí porque, se a compreensão do mundo for crítica, a ação será crítica e transformadora, se for mágica ou ingênua, assim também será sua ação no mundo.
Peço escusas por ter sido talvez prolixa nos argumentos, mas entendi que são imprescindíveis para a formação da convicção no sentido de não recomendar o presente projeto no formato que se encontra.
As inadequações, especialmente quanto ao caráter essencial de competição e premiação em dinheiro para as categorias com idade até, no mínimo 14 anos, ao meu ver, são insuperáveis, de modo que não há como diligenciar no sentido da sua correção, o que desaguaria em formulação, na realidade, de um novo projeto.
Ressalto aos eminentes colegas conselheiros que por ter laborado como instrutora e profissional da dança, durante mais de 20 anos, aliada a experiência com trabalho social e jurídico; a vivência e a responsabilidade fizeram com que me debruçasse vários dias sobre o tema até chegar ao presente parecer conclusivo.
Cabe referir que os profissionais participantes do presente projeto, na condição de proponentes, apresentadores, jurados, artistas, bem como equipes de som e iluminação, tem tido sua competência e comprometimento com a atividade cultural deste Estado reconhecida ao longo dos anos, fazem prova disto os inúmeros projetos já aprovados e priorizados, tanto por esta conselheira como pelo DD. Conselho de Cultura do RS.
Contudo, neste caso, a fundamentação invocada está a indicar a não recomendação do presente projeto.
3. Em conclusão, o projeto “Festival de Dança, Chula e Declamação de Marau” não é recomendado para a Avaliação Coletiva.
Porto Alegre, 05 de julho de 2016.
Alessandra Carvalho da Motta
Conselheira Relatora
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
Sessão das 13h30min do dia 06 de julho de 2016.
Presentes: 8 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Jaime Antônio Cimenti, Ruben Francisco Oliveira, Antônio Carlos Côrtes, Marco Aurélio Alves, Maria Silveira Marques e Vinicius Vieira.
Dael Luis Prestes Rodrigues
Secretaria de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul Departamento de Fomento Centro Administrativo do Estado: Av. Borges de Medeiros 1501, 10º andar - PORTO ALEGRE - RS