O projeto “MOSTRA DE INTEGRAÇÃO DE DANÇAS TRADICIONAIS DE MARAU E 1º SENTINARTE” não é recomendado para a Avaliação Coletiva.
1. O projeto MOSTRA DE INTEGRAÇÃO DE DANÇAS TRADICIONAIS DE MARAU E 1º SENTINARTE tem como produtor cultural FRISKE & FRISKE LTDA, empresa que também está a cargo da coordenação geral e captação de recursos, cuja responsável legal é Lisete Friske. Integram ainda a equipe principal Marcel K. Tizotti Produções, responsável pelos serviços de acompanhamento e coordenação administrativa e financeira, Sergio Bordin, como coordenador financeiro, Eleno Ramos da Silva, como coordenador geral, Rudimar Zanin, como coordenador artístico, Alcindo Bufon, como patrão de CTG, e Jovino Segala, como contador.
O projeto, que está inscrito na área de Artes Cênicas: Dança, engloba a 3ª edição da Mostra de Integração de Danças Tradicionais de Marau e o 1º Sentinarte, um evento de natureza competitiva que inclui concurso de dança e declamação nas categorias mirim, juvenil, adulta e xiru. Segundo o que consta na apresentação do projeto, o evento é uma iniciativa do Centro de Tradições Gaúchas Sentinelas do Pago de Marau, filiado ao Movimento Tradicionalista Gaúcho e Conselho Municipal de Tradições Gaúchas. A programação para a realização da mostra realizar-se-á na sede do Centro de Tradições Gaúchas Sentinelas do Pago e em pirâmides que serão locadas para a mostra. O evento compreende apresentações de danças tradicionais gaúchas, pelo elenco do CTG Sentinelas do Pago e elencos de Entidades Tradicionalistas da Região, shows com artistas gaúchos, mostra de artesanato e produtos tradicionalistas e o 1º Sentinarte - Festival de danças tradicionais e declamação que engloba artistas locais e regionais. Ainda segundo o que consta na apresentação do projeto, as normas serão regidas pelo Regulamento Artístico do Estado do Rio Grande do Sul e pelas Diretrizes para realização de Mostras, como estabelecidas pelo MTG – Movimento Tradicionalista Gaúcho. O proponente ainda aponta que o regulamento para o 1º Sentinarte segue nos anexos do projeto.
Na parte reservada á Dimensão Simbólica, entre outras informações, o proponente afirma que o evento tem o desejo de resgatar os valores de nosso povo, que tanto preza e cultua sua história: um passado de bravura e determinação, num clima de harmonia, hospitalidade e união, características fundamentais do gaúcho.
Quanto à dimensão econômica, entre outras considerações tecidas, afirma o proponente que:
O projeto em sua 3ª edição coloca a cultura como um lugar de integração, ainda mais quando agrega “Dança e Declamação”, inovação e expressão da criatividade dos gaúchos, fazendo parte do novo cenário de desenvolvimento econômico, socialmente justo e sustentável. Na realização de um evento desta envergadura torna-se impossível não pensar em propor ao Governo do Estado através da Prócultura uma parceria profícua que permita construir juntos os meios de realização do mesmo. Até porque, entende-se que foi neste sentido que se criou o Sistema de Incentivo a Cultura, a formalização de parceria que viabilizem a concretização de eventos que tenham como foco a preservação e disseminação da cultura do Rio Grande do Sul. Um evento que enalteça a cultura gaúcha em sua essência, valorizando a arte, a gastronomia, os usos e costumes peculiares à tradição rio-grandense é no contexto da comunidade de Marau uma pequena retribuição pelo muito que aqui se tem feito no resgate e na preservação da cultura de nosso Estado. Trata-se de realizar uma grande “Mostra” tradicionalista de danças artísticas, e um festival da canção, reunindo a comunidade engajada na preservação e culto aos costumes mais autênticos, disseminando-os entre as novas gerações. Garantindo assim a disseminação, sua continuidade e engrandecimento.
No que se refere à dimensão cidadã, o proponente destaca a gratuidade de todas as atividades e salienta que os espaços destinados ao evento receberão atenção especial para enquadrarem-se às normas de inclusão e acessibilidade, informação esta já referida na apresentação do projeto.
São os objetivos específicos do projeto:
valorizar o artista do Rio Grande do Sul, destacando os princípios de formação do povo gaúcho;
promover o intercâmbio cultural, além de retomar a consciência dos valores morais do gaúcho na comunidade Marauense;
preservar o patrimônio sociológico representado, principalmente, pelo linguajar, vestimenta, arte culinária, forma de lides e artes tradicionalistas;
valorizar, preservar e divulgar as artes, a tradição, os usos e costumes e a cultura do Rio Grande do Sul;
disseminar valores, ritmos, usos e costumes do nosso estado;
descentralizar os bens culturais;
possibilitar momentos de intensa fruição cultural;
realizar o 1º Sentinarte propiciando o surgimento de novos talentos.
É o relatório.
2. Diversas são as inconsistências percebidas no projeto, que não permitem, na visão desta relatora, a recomendação do mesmo. Primeiramente, o projeto está incorretamente inscrito na área de Artes Cênicas: Dança. Até mesmo uma leitura superficial permite entender que se trata de um projeto da área de Tradição e Folclore. Quando se lê o projeto mais atenta, detalhada e minuciosamente, como fez esta Conselheira, não se tem qualquer dúvida a este respeito. Não somente o projeto, como afirma o proponente, é uma iniciativa de um CTG, acontecendo na sede do mesmo, como toda a justificativa se pauta com base em argumentos tradicionalistas. Além disso, como o próprio proponente declara, o evento “compreende apresentações de danças tradicionais gaúchas, pelo elenco do CTG Sentinelas do Pago e elencos de Entidades Tradicionalistas da Região, shows com artistas gaúchos, mostra de artesanato e produtos tradicionalistas e o 1º Sentinarte - Festival de danças tradicionais e declamação (...)”. Ora, sendo o concurso de declamação parte do produto principal deste projeto, não há como sustentar que se trata de um projeto da área de dança. Por fim, ainda é afirmado que a Mostra se baseará nas diretrizes do MTG.
Outra falha bastante visível no projeto é a falta de compreensão pelo proponente do que seja Dimensão Econômica, já que, no espaço reservado a essas informações, a argumentação enaltece a dimensão simbólica do projeto, solicitando financiamento público. Aparentemente desconhece o proponente que este campo se destina a explicitar oportunidades de geração emprego e renda, de forma a democratizar os recursos públicos também neste aspecto. Quanto aos objetivos específicos elencados na proposta em tela, questiona-se se a mesma tem condições de atender a todos os itens descritos e ainda se alguns dos objetivos deveriam estar contidos num projeto de natureza cultural. Por exemplo, quanto ao objetivo promover o intercâmbio cultural, além de retomar a consciência dos valores morais do gaúcho na comunidade Marauense, questiona-se não somente como o projeto possa vir a lograr este objetivo específico, mas também se a retomada da consciência de valores morais deveria estar elencada num projeto de natureza cultural, isso porque entraríamos numa ceara, no mínimo, delicada, por assim dizer. A afirmativa não deixa claro que pressupostos teóricos subjazem essas referências do que seriam esses valores morais. Neste sentido, é imperativo que lembremos que um dos alicerces da política cultural, financiada com recursos públicos, é o fomento eventos de natureza cultural que sejam inclusivos, com vistas a reduzir preconceitos e celebrar a diversidade e não de ditar padrões de comportamento de certo e errado.
Outro ponto de inconsistência, bastante sério está no regramento da Mostra e do Sentinarte. O proponente afirma, na apresentação do projeto que as normas para a Mostra serão regidas pelo Regulamento Artístico do Estado do Rio Grande do Sul. Ora, até onde vão os conhecimentos desta Conselheira, tal documento inexiste. Na verdade, seria de causar espanto que o Estado do Rio Grande do Sul, com tantas atribuições, fosse se debruçar a redigir regulamentos artísticos para eventos privados, tarefa esta que não faz parte das suas competências. O mais próximo que o Estado chega a tangencialmente interferir em questões artísticas é quando do lançamento de editais públicos (o que não é o caso deste projeto) define critérios de avaliação, como no caso dos editais do FAC. Imagina esta relatora que talvez o proponente tenha tido algum problema de redação ao se referir ao nome do regulamento no qual pretende se basear, mas, uma vez que os anexos do projeto não incluem tal documento, a análise de mérito fica evidentemente prejudicada. Ainda na questão de regramentos, os anexos do projeto trazem um breve documento ao qual o proponente chama de regulamento do 1º Sentinarte. Tal documento, que mal ultrapassa uma página, se limita a definir o período, limite e forma das inscrições e determinar a premiação em dinheiro para cada uma das categorias concorrentes. Independente do nome que o proponente pretenda dar ao documento, este está longe de conter o mínimo de informações que qualquer regulamento artístico deveria conter. Começando pelo número de inscrições, que estão limitadas a 35 invernadas, não há um número mínimo ou máximo de inscritos por categoria. Assim sendo, poderiam concorrer de 1 a 35 inscritos por categoria. Há também uma incongruência de informações, uma vez que este “regulamento” aponta um período de inscrições de 3 a 21 de setembro, enquanto no Item 11 – Programação – é afirmado que as inscrições de estendem até o dia 25. Ainda acerca desta questão, o proponente afirma que o critério de seleção será a ordem de inscrição. Neste sentido, não percebe esta Conselheira um critério em alinhamento com os pressupostos de um evento cultural financiado com dinheiro público. A falta de pré-seleção ou triagem não parece ir ao encontro da seriedade quando se trata de um evento competitivo. Afinal de contas, já que o objetivo de parte do projeto é uma competição artística, que o seja baseada em mérito artístico e técnico desde seu início. Além disso, não sejamos ingênuos: obviamente as entidades tradicionalistas com relações mais próximos do organizador saberão do evento com maior antecedência, o que lhes confere informação privilegiada em relação às demais. E, uma vez que o evento pretende incluir premiação em dinheiro, o que, como sabemos, suscita um interesse a mais na participação do evento (ainda que os valores para as premiações não sejam elevados), não parece a esta Conselheira a utilização da ordem de inscrição como um critério democrático, com oportunidades igualitárias a todos os interessados. O suposto regulamento ainda falha em apontar tempo mínimo e máximo para as apresentações, definir uma seção de penalizações, entre tantos outros itens essenciais a qualquer regulamento, o que demonstra pouca organização para quem pretende sediar um evento artístico de natureza competitiva que seja minimamente sério.
Falando em pagamento em dinheiro, aqui se aponta mais uma inconsistência do projeto. Afirma o proponente que a Mostra será regida pelas diretrizes do MTG – Movimento Tradicionalista Gaúcho. Quanto a essas diretrizes, cita-se aqui parte do Parecer no 188/2016 CEC/RS, exarado pela Conselheira Alessandra Carvalho da Motta:
Os Festivais e Rodeios Artísticos do RS, atualmente, apresentam evidente inspiração e regramento baseado no Encontro de Artes e Tradições Gaúchas, o ENART, realizado sobre a coordenação do Movimento Tradicionalista Gaúcho em parceria hoje com o Estado do RS, através da LIC e prefeitura de Santa Cruz do Sul. Considerado pela UNESCO como o maior Festival de Arte Amadora da America Latina, o evento envolve, ano após ano, milhares de pessoas, entre concorrentes, visitantes e organizadores, contando com investimento público, privado e de colaboradores não remunerados para a sua realização.
Transcrevo, no que importa para esta fundamentação, alguns artigos do citado Regulamento do ENART:
Art. 4º - Somente poderão participar do ENART aqueles concorrentes, incluindo seus músicos acompanhantes, que completarem 15 (quinze) anos de idade até o dia definido para o início da fase final.
(...)
Art. 70 - Nas duas etapas iniciais não haverá premiação.
Art. 88 - É vedado aos promotores do ENART, em qualquer uma de suas etapas, o oferecimento de prêmios em dinheiro a qualquer participante e sob qualquer circunstância.
Ora, se o proponente diz se basear nas diretrizes do MTG, parece incongruente que ofereça pagamento em dinheiro pelas apresentações. Esclarece esta Conselheira que, pessoalmente, não vê nenhum problema em premiação em dinheiro de uma forma geral, mas é o próprio proponente que escolhe afirmar que a Mostra se baseia nas diretrizes do Movimento Tradicionalista Gaúcho, o que causa uma incoerência interna do projeto. Contudo, no que tange ao oferecimento de pagamento em dinheiro, um outro ponto aparece como central para a não recomendação do projeto, que é o pagamento de premiações em dinheiro e cachês para crianças. A planilha orçamentária aponta, claramente, nos itens 1.7 a 1.14, o pagamento de cachês às invernadas mirins. Da mesma forma, apresenta, nos itens 1.47 e 1.48, pagamento de premiação para as categorias de declamação mirim masculino e feminino, respectivamente, além do item 1.53, referente à premiação de danças mirim. Sobre esta questão, cabe a observação de que quando do envio da edição de 2016 deste projeto, foi coincidentemente distribuído à presente relatora a análise de recurso da referida proposta. O recurso foi acolhido no parecer nº 293/2016 CEC/RS e referendado pela maioria do Pleno deste Conselho, mas com algumas glosas pontuais, que foram detalhadas, como é de costume desta Conselheira. No referido parecer, é explicado, de forma didática e detalhada, o entendimento contrário deste Conselho quanto ao pagamento em dinheiro para crianças. Para uma melhor compreensão deste Pleno, cita-se aqui uma pequena parte deste parecer:
(...) No entanto, preciso chamar a atenção para um ponto (...) de extrema importância para que seja destacado neste parecer, que é o pagamento de cachês para as apresentações das invernadas mirins. Esclareço ao produtor que tem sido (...) [entendimento] deste Conselho não recomendar, sob hipótese alguma, o pagamento em dinheiro para crianças, quer seja por premiação em eventos competitivos ou, (...) como cachê. Ainda que o produtor possa argumentar que os valores pagos sirvam de ajuda para o deslocamento, além de uma pequena ajuda de custo aos CTGs para integrar o evento, estes são pagos sob forma de cachê (...). Não há como entender cachê de outra forma a não ser o pagamento em função de uma atividade exercida. Ainda que as crianças não recebam o pagamento em suas mãos ou de forma indireta, é a apresentação delas que gera tal pagamento. (...) Dessa forma, (...) o acolhimento deste recurso está condicionado a que se glose em 100% todos os pagamentos referentes às apresentações das invernadas mirins (...). Para finalizar este ponto, esclareço ao produtor que este Conselho não se opõe que sejam ofertadas às crianças premiações de outra natureza, tais como bolsas de estudo, medalhas, troféus, peças de indumentária, entre outros. A restrição é somente quando se envolve dinheiro diretamente. Além disso, nada impede que, para outras edições, o projeto preveja, em sua planilha orçamentária, gastos com transporte e, se for o caso, hospedagem.
À luz do que foi exposto, só é possível concluir duas possibilidades: ou o proponente não leu o parecer aprovado pelo Pleno deste Conselho quando da última edição do evento, ou o desconsiderou inteiramente, já que não somente mantém em seu projeto o pagamento de cachês para crianças, como inclui uma segunda atividade, de natureza competitiva, com premiação em dinheiro para categorias mirins. Neste sentido, esclarece-se ao proponente que uma das razões principais para que cada Conselheiro se debruce minuciosamente em seus pareceres é justamente para que os fazedores de cultura de nosso estado que buscam fomento através das leis de incentivo possam compreender os princípios norteadores da política cultural, caso contrário, bastaria que os projetos fossem simplesmente recomendados ou não, sem que houvesse a necessidade de uma laboriosa redação. Assim sendo, recomenda-se com veemência ao proponente que leia e releia este parecer com atenção a fim não persistir nas falhas aqui apontadas.
Por todo o exposto, percebe esta relatora que o projeto não consegue sustentar sua relevância e oportunidade, necessárias para afirmação de seu mérito e, ainda que não seja necessário, pois é entendimento desta Conselheira que aquilo que foi salientado já é substancialmente forte para a não recomendação do projeto, aponta-se que a planilha orçamentária apresenta diversas distorções, sendo uma delas inclusive apontada pelo SAT, que não habilitou a totalidade do valor pretendido.
3. Em conclusão, o projeto “Mostra de Integração de Danças Tradicionais de Marau e 1º Sentinarte” não é recomendado para a Avaliação Coletiva.
Porto Alegre, 25 de junho de 2017.
Marlise Nedel Machado Conselheira Relatora
Informe:
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
Sessão das 13h30min do dia 26 de junho de 2017.
Presentes: 19 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Jaime Antônio Cimenti, Paula Simon Ribeiro, Ruben Francisco Oliveira, José Mariano Bersch, Élvio Pereira Vargas, Erika Hanssen Madaleno, Marco Aurélio Alves, Dael Luis Prestes Rodrigues, Maria Silveira Marques, Luiz Carlos Sadowski da Silva, Luciano Fernandes, Lucas Frota Strey, André Venzon e Walter Galvani.
Abstenções: Vinicius Vieira, Rafael Pavan dos Passos e Gilberto Herschdorfer.
Antônio Carlos Côrtes
Conselheiro Presidente do CEC/RS
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