Processo nº 18/1100-0001627-8
Parecer nº 390/2018 CEC/RS
O projeto XXVIII FESTIVAL RONDA DE SÃO PEDRO DO CENTRO NATIVISTA BOITATÁ - 28 ª EDIÇÃO não é recomendado para a avaliação coletiva.
1. O projeto em epígrafe tem como produtor cultural o Centro Nativista Boitatá. Integram ainda a equipe principal Carlos Alberto Robalo Ayres como coordenador geral, Flávio André Delawy como coordenador cultural, Nandrea Silveira dos Santos como secretária, Laudelino Ferreira Santos a cargo da divulgação, Iara Ferrari Trindade como tesoureira, e Moises D. Marczewski & Cia Ltda-ME (POLSKA Empreendimentos) como responsável pela coordenação administrativo-financeira, gerenciamento e captação de recursos. O contador é Carlos Solon Soares Guimarães.
Na apresentação do projeto, o proponente nos informa que o Centro Nativista Boitatá, após um longo hiato, busca realizar a 28ª edição do festival supracitado, com o objetivo de valorizar a música gaúcha “reafirmando (...) a importância da preservação das tradições rio-grandenses, resgatando a história, causos, riquezas, sonhos, usos e costumes de nossa terra e nossa gente”. Ainda neste campo, é informado que haverá premiação em dinheiro, conforme regulamento, e que serão oferecidos shows nativistas e apresentações de danças tradicionais e parafolclóricas. O evento está previsto para ser realizado na sede social do Centro Nativista Boitatá, na cidade de São Borja, nos dias 24 e 25 de novembro de 2018.
Na área reservada à dimensão simbólica do projeto, o proponente discorre longamente sobre a cidade de São Borja, ressaltando ser a mesma a terra dos presidentes. É destacada a figura de Getúlio Vargas, explicitando-se o período em que foi presidente, bem como suas realizações, tais como a CLT, a Cia Siderúrgica Nacional, a Vale do Rio Doce, a Hidrelétrica do Vale do São Francisco e a Petrobrás. Também é feita referência a João Goulart. Ainda nesta área, o proponente, após destacar o que chama de período de glórias do município, afirma que a cidade “reserva no presente um futuro promissor para quem almeja crescer no agronegócio, turismo, comércio exterior e educação”. Enfatiza ainda que a cidade “é uma terra de oportunidades, pois, possui um dos melhores climas e solos do continente para a agricultura e está situada em uma área geográfica privilegiada para o ramo da logística, tendo um dos serviços aduaneiros mais rápidos e eficientes do Mercosul”. No que tange à cultura, o proponente destaca o Museu Getúlio Vargas, a Casa e Memorial João Goulart, além do Museu Missioneiro e Museu da Estância. São ainda mencionados o Mausoléu do Presidente Vargas, o Cemitério Jardim da Paz, onde descansam João Goulart e Brizola, a Igreja Católica Matriz, o Cemitério Paraguaio, as Fontes de São Pedro e São João Batista, além do Túmulo de Maria do Carmo (santa e profana). É também mencionada a Semana Farroupilha e o fato da cidade ser considerada a capital do fandango.
Finalizada a explanação sobre a cidade, o proponente registra uma longa narrativa sobre a lenda do Boitatá, a qual serviu de inspiração para o nome do centro nativista. A seguir, o proponente inicia seu relato sobre o próprio centro nativista e a primeira edição do festival, que aconteceu no ano de 1974. Mais adiante o proponente ressalta que os festivais de música nativista tornaram-se imprescindíveis à preservação e desenvolvimento cultural do sul do país, afirmando que estes são de “fundamental relevância às ações preservacionistas para a música nativa, pois cada vez mais a sociedade sofre influências dos diversos meios midiáticos que, paulatinamente, desconstroem e relativizam os valores culturais e sociais específicos em cada região.” O proponente ainda afirma que o regionalismo no gaúcho se sobressai aos demais estados, de forma que se faz necessário sempre resgatar este tradicionalismo através de eventos. Por fim, o proponente ainda enfatiza que eventos como o que o projeto em tela procura realizar buscam novos talentos, fomentam os artistas e incentivam a criatividade poético-musical de compositores, intérpretes, arranjadores e instrumentistas voltados à temática e aos ritmos regionais.
Nas demais áreas reservadas às justificativas do projeto, é apontada a geração de empregos, a gratuidade de acesso ao evento, bem como a observância às medidas de acessibilidade. Em outras áreas do projeto é mencionado que o evento contará com PPCI.
Dentre os objetivos elencados, destacam-se:
- Revivificar o Festival Ronda de São Pedro de São Borja;
- Valorizar, dar a devida notoriedade ao Centro Nativista Boitatá;
- Divulgar, através da arte musical, o município de São Borja, conhecida como a Terra dos Presidentes;
- Promover o entrelaçamento, o convívio, o congraçamento dos autores, compositores, intérpretes, musicistas entre si e com o público espectador;
- Criar uma consciência artística compromissada com a preservação musical sul-rio-grandense;
- Gerar reflexão, motivar sentimentos e provocar um novo pensar e agir em nossas vidas.
O regulamento, presente nos anexos do projeto, informa que o evento será composto por duas fases, sendo uma local e outra geral, onde a primeira é restrita a competidores residentes e/ou domiciliados em São Borja e a segunda aberta a quaisquer competidores, desde que as composições sejam inéditas, com ritmos e temas que representem a cultura musical de raiz do Rio Grande do Sul. Tanto intérpretes, quanto instrumentistas deverão trajar indumentária típica. É ainda informado que a administração do festival estará a cargo da patronagem do centro nativista e de uma comissão organizadora a ser indicada pelo seu patrão, competindo aos mesmos:
a) Escolher a Comissão Julgadora do Festival;
b) Divulgar o evento;
c) Receber as inscrições para o Festival;
d) Credenciar os representantes dos grupos para ingresso no recinto;
e) Contratar artistas para shows no Festival;
f) Constituir comissões de trabalho;
g) Administrar os recursos disponíveis;
h) Elaborar relatório de prestação de contas;
i) Elaborar planilhas a serem utilizadas pela Comissão Julgadora;
j) Resolver todas as questões omissas neste regulamento;
k) Contratar serviços de produtores culturais e terceirização de sonorização e gravação.
O regulamento ainda informa que as 14 músicas classificadas comporão o CD do festival, o qual servirá para a divulgação do evento. É ainda explicitado que os competidores deverão enviar as músicas concorrentes já gravadas em estúdio em condições de serem inseridas no CD, uma vez que não haverá gravação do CD ao vivo no ato da realização do festival. O regulamento ainda aponta que a comissão organizadora avaliará a condição da matriz entregue (CD) e que, caso a mesma seja considerada inapta, a composição terá o prazo até o momento de entrar no palco para apresentar outra gravação em condições, sob pena de ser excluída do festival. Ainda sobre o regulamento, é informado que os jurados se valerão de critérios próprios, bem como avaliações pessoais, para definir as premiações do festival.
Além do evento competitivo, o projeto conta ainda com os shows de César Oliveira e Rogério Melo, Emerson Gottardo, do núcleo nômade de dança e pesquisa parafolclórica Mi Tolderia, além de apresentações de invernadas do Centro Nativista Boitatá.
O projeto está orçado em R$ 142.270,00 (cento e quarenta e dois mil, duzentos e setenta reais), sendo 136.870,00 (cento e trinta e seis mil, oitocentos e setenta reais) solicitados ao Sistema LIC/RS, havendo o aporte de R$ 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos reais) do proponente.
É o relatório.
2. Com um parecer favorável, o projeto foi relatado no pleno deste conselho, sendo que, dos 19 conselheiros presente, somente um acompanhou o voto do relator. O projeto foi então redistribuído para nova análise, como explicitado no regimento interno deste conselho. Embora o projeto esteja redigido de forma clara, contendo poucos erros gramaticais, especialmente se levarmos em consideração as longas narrativas, há uma série de questões que, na visão desta relatora, não permitem sua recomendação à avaliação coletiva.
Primeiramente, examinemos as justificativas do projeto. Ora, entende-se que o proponente tenha orgulho de sua cidade, a qual, repetidas vezes foi citada como a Terra dos Presidentes, bem como de seus pontos turísticos e fontes de economia; compreende-se também que seja enaltecida a figura de Simões Lopes Neto e a lenda do Boitatá, a qual serviu de inspiração para o nome do centro nativista. Entretanto, apesar das longas e bem redigidas narrativas, tais informações não substanciam a dimensão simbólica da proposta, uma vez que não têm qualquer relação direta com o evento em si. De qualquer forma, esta observação não é o que definiu a não recomendação do projeto, mas entende-se que é importante em um parecer apontar ao proponente aquilo que pode ser melhorado para uma próxima oportunidade. Neste sentido, também se recomenda a revisão dos objetivos elencados. Por exemplo, não se percebe como o evento possa vir a “gerar reflexão, motivar sentimentos e provocar um novo pensar e agir em nossas vidas”, até porque a proposta não apresenta nada de inovador ou original, já que festivais semelhantes acontecem em grande número em todo o estado.
Os fatores preponderantes para a não recomendação do projeto, no entanto, foram outros. Sendo uma proposta de festival competitivo, um dos pontos fundamentais de análise é a formação do corpo de jurados e os critérios de avaliação que serão utilizados para a definição dos vencedores. No entanto, o projeto é omisso quanto a esses itens. Não se sabe quem serão os jurados, nem mesmo a equipe de triagem. Além disso, como explicitado no regulamento, não há critérios de avaliação, sendo que é mencionado que os jurados poderão, inclusive se valer de avaliações pessoais para definirem as premiações. Enfatiza-se ao proponente a grande importância de que sejam definidos critérios de avaliação, e salienta-se que abrir espaço para que o gosto pessoal defina os premiados coloca uma dose de subjetividade ainda maior em algo que já é, até certo ponto, subjetivo, que é a avaliação de obras artísticas. Sugere-se que, para uma próxima vez, os critérios de avaliação, bem como os pesos correspondentes a cada item, estejam explicitados no regulamento. Isso servirá inclusive para guiar os concorrentes em suas inscrições. Além disso, também é preocupante que os membros do júri venham a ser escolhidos pela patronagem do centro nativista. Com o devido respeito a todos os envolvidos, que, com certeza, se dedicam muito a trabalharem por sua entidade, a função de curador deveria ser feita por alguém especializado, que pudesse compor uma banca de avaliação plural a fim de que a análise pudesse ser verdadeiramente abrangente. Finalizando esta parte, entende-se que a combinação da falta dos nomes dos jurados e da equipe de triagem, da ausência de critérios, com a possibilidade de que o gosto pessoal possa ser usado como avaliação, além da curadoria não especializada, colocam muitas dúvidas sobre se os objetivos elencados, de fato, virão a ser atingidos. Finaliza-se esta parte apontando que há vários pontos no regulamento que deveriam ser revisados para uma próxima vez. Por agora, salienta-se, especialmente, a omissão de uma cláusula que proíba a inscrição na competição de cônjuges ou parentes de qualquer membro da comissão avaliadora, de triagem ou de organização do evento, o qual é essencial para a lisura do processo e que, via de regra, costuma estar presente nos regulamentos de qualquer competição. Recomenda-se ao proponente que estude modelos de regulamentos e converse com organizadores mais experientes a fim de aprimorar sua proposta no futuro.
Outro ponto bastante preocupante diz respeito ao CD do festival. Entende-se que a qualidade das músicas enviadas precisa ser boa o suficiente para uma análise dos avaliadores na fase de triagem. No entanto, exigir que a composição já tenha qualidade pronta para integrar o CD do festival, demanda mais um investimento financeiro por parte dos competidores classificados, que já estarão gastando com seus deslocamentos, alimentação e hospedagem. Além disso, como aponta o regulamento, será a comissão organizadora, a qual é formada pela patronagem do centro nativista, como já referido, que estará a cargo de avaliar se a matriz entregue por cada competidor tem condições ou não de servir para a mixagem do CD do festival. Mais uma vez, com todo o respeito aos componentes da patronagem, a qualidade de uma matriz deveria ser avaliada por um profissional da área, caso contrário o resultado final tem grandes chances de ser comprometido. Ainda quanto ao CD, aponta-se a inconsistência de que, no corpo do projeto, é afirmado que serão produzidas 1.000 unidades, enquanto no regulamento é afirmado que serão somente 500 cópias. Recomenda-se uma revisão entre o que é afirmado no corpo da proposta e em seus anexos. Além disso, o centro nativista pretende ficar com todas as cópias para si (a exceção da quota reservada à SEDACTEL) a fim de divulgar o evento, sem dizer de que forma pretende fazê-lo, o que nos leva a mais uma área problemática no projeto: sua divulgação. Como explicitado no regulamento do projeto, esta área também estará a cargo da patronagem do centro nativista; não sendo apontado um profissional que venha a produzir as peças gráficas, nem um assessor de imprensa. Além da tarefa de atingir um público de 5.000 pessoas, o evento tem o desafio de se fazer conhecido outra vez a fim de atrair inscritos não somente de São Borja, mas de todo o estado e do país. Especialmente porque o festival pretende ser retomado após um longo período, como espera o proponente que haja inscrições para além da sua própria cidade para a etapa geral? Não há uma linha sequer sobre as estratégias de divulgação, não sendo mencionada a criação de um site, uma página na internet, redes sociais, etc. Mais uma vez, a ausência de um profissional, como um assessor de imprensa, por exemplo, preocupa, deixando dúvida sobre a real extensão do festival nesta sua retomada após tantos anos, bem como se os objetivos elencados serão alcançados.
Para finalizar, esta relatora considera importante comunicar ao proponente que entende como legítima a iniciativa do centro nativista em sediar novamente seu festival, haja vista que tantas outras entidades por todo o estado estão fazendo a mesma coisa. Entende-se também o empenho em assumir, de forma voluntária, tantas responsabilidades para si. Provavelmente, a equipe está formada por colaboradores que, imbuídos de boa vontade, pretendem dar seu auxílio à entidade, o que já devem fazer no dia-a-dia da instituição. No entanto, aquela geração de emprego e renda a que o proponente se refere na área destinada à justificativa da dimensão econômica deveria se refletir na contratação de profissionais que venham a garantir o bom planejamento do projeto, seu acompanhamento, bem como a qualidade de sua execução, o que claramente não acontece. Neste sentido, mais uma vez, recomenda-se ao proponente que revise seu projeto.
3. Em conclusão, o projeto XXVIII Festival Ronda de São Pedro do Centro Nativista Boitatá - 28 ª Edição não é recomendado para a avaliação coletiva.
Porto Alegre, 16 de outubro de 2018, ano do cinquentenário do Conselho Estadual de Cultura.
Marlise Nedel Machado
Conselheira relatora
Informe:
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
Sessão das 13h30min do dia 17 de outubro 2018.
Presentes: 23 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Ivo Benfatto, Plínio José Borges Mósca, Paulo Cesar Campos de Campos, Luis Antonio Martins Pereira, Liana Yara Richter, Jorge Luís Stocker Júnior, Moreno Brasil Barrios, Marlise Nedel Machado, Marcelo Restori da Cunha, Claudio Trarbach e Marco Aurélio Alves.
Não Acompanharam o Relator os Conselheiros: Paula Simon Ribeiro, José Airton Machado Ortiz, José Édil de Lima Alves, Maria Silveira Marques, Dalila Adriana da Costa Lopes, Antônio Carlos Côrtes, Jaime Antônio Cimenti, Dael Luis Prestes Rodrigues, Gilberto Herschdorfer e Gisele Pereira Meyer.
Abstenções: André Venzon.
Ausentes no Momento da Votação: Ruben Francisco Oliveira.
Marco Aurélio Alves
Conselheiro Presidente do CEC/RS
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