Processo nº 19/1100-0001986-8
Parecer nº 436/2019 CEC/RS
O projeto “NOVO CARNAVAL DE PORTO ALEGRE 2020” é recomendado para a avaliação coletiva.
1. O projeto passou pela análise técnica do sistema Pró-Cultura e foi habilitado pela SEDAC - Secretaria de Estado da Cultura, sendo encaminhado a este Conselho nos termos da legislação em vigor a este conselheiro em 20 de novembro de 2019. Sua área é CARNAVAL DE RUA e será realizado de 20/03/2020 à 21/03/2020, no Complexo Cultural do Porto Seco, zona norte de Porto Alegre. O proponente é J N DA SILVA EIRELI - ME CEPC: 6205 e o contador é Lair Coimbra Rezende CRC: 36408. O projeto prevê Receitas com comercialização de bens e serviços na ordem de R$ 750.000,00, cabendo a LIC o valor total de R$ 239.820,00 num total de R$ 989.820,00.
O projeto visa a realização do desfile de Carnaval de Porto Alegre de 2020 no Complexo Cultural do Porto Seco, proporcionando estrutura e meios para a realização do desfile das entidades carnavalescas, bem como adequações para a população em geral, fortalecendo o vínculo da comunidade com a cultura popular. Segundo o proponente, Porto Alegre já teve um dos grandes carnavais do país, mas atualmente passa por grave crise, sendoo carnaval inclusive cancelado por falta de recursos financeiros nos anos de 2017 e 2018, e acabou por ter um acanhado desfile em 2019. Este projeto visa resgatar os grandes carnavais das escolas de samba, buscando dar condições para a realização de um grande carnaval no ano de 2020, que será chamado de NOVO CARNAVAL DE PORTO ALEGRE. Fazem parte deste projeto as agremiações de samba da série ouro: Acadêmicos de Gravataí; Bambas da Orgia; Embaixadores do Ritmo; Estado Maior da Restinga; Imperadores do Samba; Imperatriz Dona Leopoldina; Império da Zona Norte; União da Vila do IAPI, com diversas medidas de acessibilidade, democratização de acesso, bem como diversos cuidados para redução do impacto ambiental nos locais de realização PPCI, bombeiros civis e segurança. Este projeto, além da integração cultural entre comunidades, também demonstra a qualidade da cultura carnavalesca produzida em nosso estado.
É o relatório.
2. O carnaval é a festa popular mais celebrada e referente do Brasil, mesmo sendo herança de nossos colonizadores; a História do Carnaval remonta à Antiguidade, tanto na Mesopotâmia e Egito, quanto na Grécia e em Roma. Foi transmitida oralmente através de séculos, como herança de festas pagãs de caráter orgíaco, como o rito Dionisíaco (na Grécia antiga) e os festejos de Pã (na Roma antiga).
Na antiga Babilônia, duas festas possivelmente influenciaram também o que hoje conhecemos como carnaval. As Saceias: uma festa em que um prisioneiro assumia durante alguns dias a figura do rei, vestindo-se como ele, alimentando-se da mesma forma e dormindo com suas esposas. Para, ao final ser chicoteado e depois enforcado ou empalado.
O outro rito era realizado pelo Rei nos dias que antecediam o equinócio da primavera, período de comemoração do ano novo na região. O ritual ocorria no templo de Marduk, um dos primeiros deuses mesopotâmicos, onde o rei perdia seus emblemas de poder e era surrado na frente da estátua de Marduk. Essa humilhação servia para demonstrar a submissão do rei à divindade, que depois reassumia o trono.
Muitos desses ritos eram proibidos por causa do caráter de subversão e, esse espírito possivelmente tenha influenciado a subversão de papéis sociais do carnaval, como os homens vestirem-se de mulheres e vice-versa, assim como as máscaras que foram influência da Commedia Dell'Arte e das festas religiosas de epifania.
Com o advento do cristianismo, a igreja católica começou a combater as manifestações pagãs, sacralizando algumas, como o Natal e o Dia de Todos os Santos, porém o Carnaval, mesmo mal visto pela igreja, foi uma das poucas festividades a guardar seu caráter profano, mas restrito apenas aos dias que antecedem a Quaresma.
O Carnaval, no Brasil, é o reflexo das muitas referências culturais dos povos que chegaram aqui e, combinadas de variadas formas, gera a expressão original que se tornou referência para o mundo.
No Brasil, o carnaval foi uma herança trazida pelos portugueses, manifestado principalmente na comemoração chamada de “entrudo”, pela qual eram promovidas brincadeiras como jogar farinha, tinta e água nas pessoas. O entrudo era considerado ainda uma prática violenta e ofensiva, em razão dos ataques às pessoas, mas era bastante popular. A festa, no entanto, não passou incólume pela cultura brasileira e foi influenciada pelos folclores indígena e africano e incorporada pelos escravizados. A variedade da festividade é observada até hoje em várias regiões do país.
O carnaval contribuiu decisivamente para levar ao conhecimento da população a existência e a importância de nomes como Zumbi dos Palmares, Chico Rei e Chica da Silva, na época em que estes personagens eram ignorados pela ‘história oficial’ apresentada nos livros escolares.
O carnaval permanece relevante para a cultura negra, ao mantê-la viva e ativa nas celebrações. “Nelas o negro é protagonista”, o carnaval é uma possibilidade do negro se enxergar em sua cultura por oferecer conhecimento e, com isso, desfazer preconceitos por meio de enredos que o represente, principalmente no que se refere à religiosidade, alvo constante de manifestação de intolerância. Então, pelas vias culturais, ele pode encontrar o espaço que ainda lhe é negado.
Mesmo que o Carnaval tenha sido tomado pelos traços midiáticos do mundo televisivo, ele não se desvincula de suas representações culturais como festa popular e nem deixa de refletir a cultura de seu povo.
O carnaval em Porto Alegre surgiu nos bairros pobres como o ''Areal da Baronesa'' e ''Colônia Africana''. O primeiro é assim chamado por ser na beira do rio (uma praia, posteriormente aterrada e onde hoje é a Praça Cônego Marcelino) e que tem esse nome por antigamente pertencer a Baronesa (esposa do Barão de Gravataí), e o segundo pelo número de negros que ali fixaram residência. Foram os locais onde os escravizados libertos passaram a morar após a abolição da escravatura.
O Areal era um reduto totalmente carnavalesco: a partir dos anos 30 já havia notícias em jornais de grupos com nomes de ''Ases do Samba'', ''Nós os Comandos'', ''Seresteiros do Luar'', ''Nós os Democratas'', ''Viemos de Madureira'', ''Tô com a vela'', ''Os Caetés'' e, mais recentemente, os ''Imperadores do Samba'', todos tiveram origem no Areal. Foi onde surgiu o Rei Negro (Seu Lelé), primeiro Rei Momo Negro da cidade.
O outro bairro de negras origens da cidade, a chamada "Colônia Africana", aos poucos foi perdendo sua negritude pela exploração imobiliária, e hoje tem nomes pomposos como bairro Rio Branco, Mont´Serrat e adjacências. Esse era também o local onde negros libertos foram morar. Da Colônia surgiram grupos como o ''Aí Vem a Marinha'', ''Prediletos'', ''Embaixadores'', ''Namorados da Lua'' etc...
No entanto, pelo caráter racista dos porto-alegrenses e pela covardia de seus governantes, o carnaval acabou expulso do centro, sendo deslocado para o Porto Seco na zona norte de Porto Alegre, o qual nunca foi acabado e, onde não há um sistema de transporte adequado para aqueles que moram em bairros mais distantes. Mesmo assim, desde sua inauguração, em 2004, os carnavalescos vêm investindo suas criações na consolidação do espaço. Porém, nas últimas gestões da cidade, o orçamento dos desfiles de carnaval da cidade foi minguando, a ponto da atual gestão zerá-lo totalmente.
Enfim, é imensurável o valor cultural e histórico do carnaval, e da cultura negra em sua expressão identitária.
3. Condicionantes
O projeto precisa apresentar proposta em relação às medidas de acessibilidade e questões relacionadas à segurança, incluindo o APPCI, redução de impacto ambiental, bem como o cumprimento da Lei do Artista com uso de nota contratual na contratação de artistas e técnicos segundo a lei do artista – Lei nº 6533/1978, Decreto nº 82385/1978, Portaria MTB nº 656/2018, atendendo à observância do uso da nota contratual segundo a lei na contratação de artistas e técnicos, conforme a Lei nºs 6533/78, Dec 82385/78, Lei 3857/60, e quanto aos modelos de contratos e nota contratual na nota MTB nº656/2018, além das Normas de Segurança do Trabalho: NR10, NR18 e NR 35 - tópicos que estão devidamente previstos para serem comprovados pelo proponente junto ao gestor do Sistema Pró-cultura/RS, sob pena de não usufruir dos recursos pleiteados, caso não sejam atendidas tais exigências.
4. Em conclusão, o projeto “Novo Carnaval de Porto Alegre 2020” é recomendado para a avaliação coletiva em razão de seu mérito cultural – relevância e oportunidade – podendo receber incentivos até o valor de R$ 239.820,00 (duzentos e trinta e nove mil, oitocentos e vinte reais) do Sistema Unificado de Apoio e Fomento à Cultura – Pró-Cultura RS.
Porto Alegre, 09 de dezembro de 2019.
Marcelo Restori da Cunha
Conselheiro Relator
Informe:
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
A liberação dos recursos solicitados em incentivos fiscais está condicionada à comprovação junto ao gestor do sistema do rígido cumprimento das normas de prevenção a incêndios no(s) local(is) em que o evento for realizado.
Sessão das 13h30min do dia 09 de dezembro de 2019.
Presentes: 22 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Benhur Bortolotto, Ivo Benfatto, Paula Simon Ribeiro, Cristiano Laerton Goldschmidt, Gisele Pereira Meyer, Plínio José Borges Mósca, Daniela Giovana Corso, Sandra Helena Figueiredo Maciel, Nicolas Beidacki, Luis Antonio Martins Pereira, Paulo Leônidas Fernandes de Barros, Gilberto Herschdorfer, Vitor André Rolim de Mesquita, Rodrigo Adonis Barbieri, Jorge Luís Stocker Júnior, MMarlise Nedel Machado, Vinicius Vieira de Souza, Dalila Adriana da Costa Lopes, Gabriela Kremer da Motta e José Airton Machado Ortiz.
Em razão do Of. Nº 182/2015 da SEDAC, os projetos recomendados por este Conselho foram submetidos à Avaliação Coletiva da Sessão Plenária Ordinária do dia 20/12/2019 e considerados prioritários.
José Édil de Lima Alves
Conselheiro Presidente do CEC/RS
Secretaria de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul Departamento de Fomento Centro Administrativo do Estado: Av. Borges de Medeiros 1501, 10º andar - PORTO ALEGRE - RS