Processo nº 00099/2021
Parecer nº 117/2021 CEC/RS
O projeto “FEIJOADA TURMALINA 1ª EDIÇÃO” é recomendado para financiamento pela LIC-RS.
1. O projeto em pauta, após realizada a análise pela equipe técnica do Pró-Cultura RS e sendo atendidas as diligências solicitadas é considerado adequado quanto a sua proposta sendo recomendado para avaliação coletiva.
O projeto tem como produtor cultural LEO PIANKI MORALES TELES, por contadora Jane Eunice Fragozo dos Santos, se classifica como MÚSICA e não está vinculado a data fixa. O valor proposto para financiamento em sua totalidade pelo sistema LIC é de R$ 128.000,00 (cento e vinte e oito mil reais).
O Coletivo Turmalina de criadores negrodescendentes atua desde 2017 na cidade de Porto Alegre, movimentando produtores musicais, djs e performance. Suas primeiras articulações, se voltaram a produção de eventos na cidade, direcionados ao público negro. O projeto Feijoada Turmalina surgiu a partir da intenção de propor atividades para além da pista, que dialoguem com a comunidade negrodescendente e periférica de maneira contínua. O projeto tem interesse em capacitar artistas com pouco ou nenhum acesso aos recursos necessários para difusão de suas produções, bem como processos de criação, softwares, equipamentos, estratégias de comunicação e agenciamento entre outros fatores, cuja ausência distancia os artistas dos resultados desejados. Em sua primeira edição, o coletivo busca unir neste projeto fornecedores e prestadores de serviço que atuam fora dos grandes centros, na ideia de ampliar esse mercado criativo e colocar outros profissionais em destaque. Serão apadrinhadas 5 inscrições (grupo ou artista solo), a desenvolver as etapas de: Oficinas de Capacitação (Produção Musical, Performance, Comunicação, Audiovisual, Mixagem, Produção de Eventos), Diária em Estúdio para gravação das faixas, Gravação de Clipe, Lançamento das faixas e Apresentação Pública no final do processo. O Projeto orçado em 128.000,000, terá duração de 10 meses (1 de junho de 2021 a 31 de março de 2022) e conta com mais de 20 profissionais envolvidos (instrutores, pessoal técnico, fornecedores e prestadores de serviço).
Em sua Dimensão Simbólica a articulação do coletivo Turmalina se mostrou peça importante na ressignificação de identidades da cena eletrônica de Porto Alegre ao possibilitar que corpos negros pudessem ocupar espaços que antes lhes eram limitados; ao apresentar outras possibilidades de existência e atuação desse público frequentemente minorizado e, ao reapropriar métodos de produção e fortalecimento à realidade dessa população. Como forma de aproximar essa população de outras alternativas e tecnologias, o projeto Feijoada Turmalina deseja compartilhar habilidades, para expandir essa cadeia criativa.
Em sua Dimensão econômica o coletivo busca formas de garantir seu próprio sustento realizando eventos, voltados à música e performance, com interesse em viabilizar a sobrevivência de seus integrantes e apoiadores. A maioria desses artistas se encontra em realidade periférica, onde os recursos chegam com ainda mais dificuldade, quando chegam. Em um contexto de pandemia de Covid - 19, as alternativas de renda estão cada vez mais limitadas, logo, acreditamos que uma saída para esses novos criadores será encontrar suas próprias ferramentas de sustento.
Quanto a sua Dimensão Cidadã O objetivo principal do projeto é impulsionar criadores de periferia. Nestes grupos, representados como minoria a partir de uma visão superficial e limitante, iremos priorizar a participação de mulheres e pessoas LGBTQI+, que se inscreverem para a formação. É previsto incluir ações de acessibilidade como audiodescrição e formato visual para daltonismo. A ideia que permeia o projeto desde sua concepção é justamente a inclusão de públicos invisibilizados no cenário criativo, fornecendo ferramentas para que esses possam expandir sua criação.
É o relatório.
2. A população negra é a mais afetada pela desigualdade no Brasil. É o que alerta a Organização das Nações Unidas (ONU). Já o Ministério Público do Trabalho afirma que pretos e pardos enfrentam mais dificuldades na progressão da carreira, na igualdade salarial e são mais vulneráveis ao assédio moral.
De acordo com o Atlas da Violência, a população negra também corresponde a maioria dos indivíduos com mais chances de serem vítimas de homicídios e feminicídios. Atualmente, de cada 100 pessoas assassinadas no Brasil, 71 são negras.
Além das questões de violência, o Brasil é um país que convive com uma desigualdade estrutural e preconceito social que, invariavelmente, passa também pelo racismo, embora, segundo o IBGE, mais da metade da população brasileira (54%) seja de pretos ou pardos.
Na contramão destes dados, segundo a ONG britânica Oxfam, dedicada a combater a pobreza e promover a justiça social apenas em 2089, isto é, daqui a pelo menos 72 anos, brancos e negros terão uma renda equivalente, ou seja, 200 anos depois da abolição da escravidão no Brasil. Isso se a desigualdade continuar diminuindo no ritmo que está”, alerta a diretora-executiva da Oxfam.
Em relação a representatividade no cinema e na literatura as estatísticas não mudam.
Só 10% dos livros brasileiros publicados entre 1965 e 2014 foram escritos por autores negros, afirma pesquisa da Universidade de Brasília que também analisou os personagens retratados pela literatura nacional aonde 60% dos protagonistas são homens e 80% deles, brancos.
Já a pesquisa “A Cara do Cinema Nacional”, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, revelou que homens negros são só 2% dos diretores de filmes nacionais. Atrás das câmeras, não foi registrada nenhuma mulher negra. O fosso racial permanece entre os roteiristas aonde somente 4% são negros.
O levantamento da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) considerou as produções brasileiras que alcançaram as maiores bilheterias entre 2002 e 2014. Dentre os filmes analisados, 31% tinham no elenco atores negros, quase sempre interpretando papeis associados à pobreza e criminalidade, crise e desemprego.
Ao ser confrontado com as estatísticas, o racismo brasileiro, sustentado em três séculos de escravidão revela-se sem meias palavras.
Para minimizar estas agruras em relação a população negra, agruras estas aumentadas em função da pandemia, é que surgiu, em Porto Alegre, o Coletivo Turmalina colocando-se em evidência enquanto mecanismo de resistência social, trabalhando com expressões artísticas no campo visual e sonoro propostos pela ótica das populações negras. O Projeto Feijoada Turmalina é um caldeirão coletivo de saberes aonde se cozinha a arte num aproveitamento do potencial de cada integrante do Coletivo compartilhando, estas capacidades individuais, com as suas comunidades na função de orientadores e instrutores.
As dificuldades em participar de editais, os erros básicos mas evitáveis de uma carreira artísticas, os entraves estruturais, são alguns dos motes deste belo projeto que considero fundamental como instrumento de integração e capacitação das classes menos favorecidas. O conhecimento, o estudo, a prática, a autoestima, são valores a serem observados neste projeto que conta com uma equipe de profissionais qualificados da pré-produção até a divulgação dos trabalhos desenvolvidos.
Todos os contatos foram realizados online ou por telefone, em respeito as medidas de distanciamento adotadas pela pandemia de Covid - 19. A partir da seleção, os artistas participarão de um processo imersivo onde se aproximarão das ferramentas de produção musical, audiovisual e de agenciamento. Os encontros serão semanais, aos domingos do mês de junho a setembro. Ao início das oficinas, a equipe de logística planeja viabilizar transporte e alimentação para que os artistas selecionados (em sua maioria de realidade periférica e/ou de baixa renda), possam participar das atividades.
A capacitação deste projeto se dividirá em quatro módulos: Produção Musical, Produção Audiovisual, Mixagem em CDj e Comunicação. Após as oficinas, é iniciada a segunda etapa do projeto, onde os selecionados irão a estúdio para gravação de vocais e instrumentos de sua escolha.
Um show pelo canal do Youtube do coletivo, com transmissão aberta ao público acontecerá no dia 19 de dezembro marcando o fim das atividades do projeto em 2021. Em janeiro de 2022, o projeto retoma suas atividades para edição das imagens captadas durante o período de imersão. A entrega do documentário está prevista para o primeiro semestre de 2022.
Como podemos observar na clara metodologia e no cuidado com a descrição do projeto, o Coletivo Turmalina, que em 2020 foi um dos 8 projetos classificados no edital da Natura Musical, é bem estruturado e tem um olhar voltado para atividades sem apelo comercial bem como a distribuição harmoniosa dos recursos auferidos.
Neste projeto Feijoada Turmalina podemos observar a preocupação com os artistas de periferia, capazes artisticamente, mas desconhecedores dos segredos para uma participação em igualdade de condições. Tal projeto é louvável e gratificante em suas dimensões simbólicas, econômicas e cidadãs, bem arrazoado, além de salvaguardar bens culturais sendo a acessibilidade o grande trufo desta proposta..
Observou-se, no relatório, que haverá precauções em ralação a pandemia mas nunca é demais recomendar que, dependendo da evolução da Covid 19 por ocasião da realização deste projeto, se observe o contido no art. 1º, parágrafo único, da Resolução Nº 02/2020 do CEC RS aonde o produtor proponente deverá acatar às decisões legais das autoridades competentes referentes ao enfrentamento da pandemia.
3. Em conclusão, o projeto “FEIJOADA TURMALINA 1ª EDIÇÃO” é recomendado para financiamento público, em razão de seu mérito cultural, relevância e oportunidade, podendo captar R$ 128.000,00 (cento e vinte e oito mil reais) junto ao Sistema Integrado de Apoio e Fomento à Cultura.
Porto Alegre, 14 de abril de 2021.
Léo Francisco Ribeiro de Souza
Conselheiro Relator
Informe:
O prazo para recurso somente começará a fluir após a publicação no Diário Oficial.
O Presidente, nos termos do Regimento Interno, somente votará em caso de empate.
A liberação dos recursos solicitados em incentivos fiscais está condicionada à comprovação junto ao gestor do sistema do rígido cumprimento das normas de prevenção a incêndios no(s) local(is) em que o evento for realizado.
Sessão das 10h do dia 20 de abril de 2021.
Presentes: 24 Conselheiros.
Acompanharam o Relator os Conselheiros: Benhur Bertolotto, Alexandre Silva Brito, Aline Rosa, Cristiano Laerton Goldschmidt, Alice Inês Lorenzi Urbim, Daniela Giovana Corso, Sandra Helena Figueiredo Maciel, Liliana Cardoso Rodrigues dos Santos Duarte, Nicolas Beidacki, José Francisco Alves de Almeida, Paulo Leônidas Fernandes de Barros, Lucas Frota Strey, Vitor André Rolim de Mesquita, Rodrigo Adonis Barbieri, Luciano Gomes Peixoto, Luiz Carlos Sadowski da Silva, Luis Antônio Martins Pereira, Mario Augusto da Rosa Dutra, Vinicius Vieira de Souza e Michele Bicca Rolim.
Ausentes no Momento da Votação: Elma Nunes Sant’Ana e Rafael Pavan dos Passos.
Em razão do Of. Nº 021/2021 da SEDAC, os projetos recomendados por este Conselho foram submetidos à Avaliação Coletiva da Sessão Plenária Ordinária do dia 28/04/2021 e considerados prioritários.
Após a avaliação coletiva, que atribui o grau de prioridade aos projetos, o projeto é prioritário obtendo a nota final de 4,10 pontos.
José Airton Machado Ortiz
Presidente do CEC/RS
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